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Introdução
O artigo aborda a educação da jovem brasileira
representada nos meios de comunicação. Problematiza-se as imagens a que
essas jovens são submetidas, que em grande parte buscam persuadir ao consumo
de produtos e que apresentam um conteúdo pedagógico que proporciona padrões
de identidade e comportamento associados ao público feminino. A mulher ideal
que se almeja vive nas páginas das revistas, nas imagens da televisão, nos
filmes de Hollywood, e parece dizer “seja como eu e será feliz”.
Tem-se como objetivo compreender como os meios de
comunicação influenciam na educação da jovem mulher e como a escola pode
contribuir para a não aceitação da “violência simbólica” que é promovida por
esses meios. Para tanto, faz-se uma abordagem crítica acerca dos mecanismos
utilizados pela indústria cultural para que haja subsídios que contraponham
o que vem sendo imposto a serviço do consumismo.
A opção em trabalhar com o público feminino deriva
da forma como o conceito de gênero vem demonstrando uma concepção de
inferioridade intelectual, física, social e cultural da mulher em relação ao
homem. Os meios de comunicação exploram a imagem da mulher e acabam por
construir uma identidade feminina voltada ao mercado de consumo: O corpo da
mulher exposto como mercadoria!
Dados recentes comprovam que o mercado de trabalho
cada vez mais exige um padrão de mulher a ser seguido. A jornalista Fabiana
Caso apresenta a matéria “Discriminação encorpada” no jornal O Estado de
São Paulo de 08 de abril de 2007. O assunto abordado diz respeito ao
preconceito velado às pessoas obesas que não foram admitidas em empresas por
não corresponderem a um determinado perfil “de uma sociedade de valores
estéticos”. Volta-se a questão de que a mídia e os meios impressos também
apresentam imagens de corpos esculpidos como um sinônimo de beleza associada
à felicidade. “A sociedade só quer estar perto do belo. Tudo o que foge do
padrão estipulado é discriminado” (O Estado São Paulo, 2007, p. 08).
Nota-se uma proposta de identidade juvenil na
mídia e nos meios impressos que correspondem à sociedade, por um lado, pesa
sobre os jovens a tarefa de lutar, criar, revolucionar, por outro lado,
tem-se um modelo de jovem trabalhado nos discursos publicitários que parece
associar rebeldia e conformismo! Lembrando Edgar Morin, “(...) a orientação
consumidora destrói a autonomia e a hierarquia estética próprias da cultura
cultivada”. (1967, p. 20) Como propor mudanças seguindo estereótipos?
Verifica-se então um processo complexo que confronta expectativas associadas
à juventude.
O artigo “A novela dos sarados” publicado por
Adriana Miranda no Jornal da Unicamp, em 18 de abril de 2001, aborda
dados da tese de doutorado “O adolescente e a TV: o caso da Telenovela
Malhação”, produzida pela pedagoga Maria Inez Masaro. O trabalho realizado
na Unicamp inseriu um novo dado: “parcela significativa dos adolescentes se
vale da ficção para aprender a paquerar, conquistar e namorar na vida
real”. Essa pesquisa ainda ressalta a insuficiente participação da escola
no processo de formação dos adolescentes, sendo a televisão a maior
responsável pela divulgação dos modelos nos quais os jovens se espelham.
Há interesse quanto à construção da identidade de
indivíduos e grupos, ou seja, são criadas normatizações e padronizações às
pessoas para a manutenção de um perfil homogêneo, facilitando o exercício do
poder. Para que esses meios se mantenham, eles precisam convencer e manter
audiência, por isso se utilizam de diversos mecanismos. É nesse sentido que
a instituição escolar pode, em contrapartida, trabalhar esse discurso
reducionista apresentado por esses meios, instruindo o indivíduo de forma
crítica e conscientizadora sobre os mecanismos dos meios de comunicação que
colaboram para a manutenção da sociedade capitalista atual.
Diante desses
dados, o presente trabalho ressalta a imagem da mulher transmitida por dois
veículos da mídia - impressa e televisiva - a revista Capricho (Editora
Abril) e o programa Malhação (Rede Globo). Observa-se no discurso dessas
fontes um ideal de mulher apresentado como referência à sociedade vigente.
2.
Papéis atribuídos à jovem mulher pelos meios de comunicação
Quando se fala em proposta educacional dos meios
de comunicação às jovens mulheres, entende-se que todo esse processo está
interligado ao “desejo” que os mecanismos publicitários despertam nas
pessoas, o que acaba por gerar padrões a serem seguidos. “São utilizadas
tantas formas e as estratégias e são tantas, que tal inversão de valores se
sobrepõe e se instala nos desejos humanos com aspiração ideal e necessidades
vitais” (Fabiano, 1986, p. 40). Assim, os meios de comunicação apresentam um
discurso voltado à representação de conceitos e valores que possam atingir o
maior número de pessoas.
Temos, portanto, naquilo que
convencionalmente se chama linguagem da televisão, a redução de tipos, de
acontecimentos, de situações e esquemas básicos, conteúdos de forma simples
e facilmente identificáveis. Essa padronização criada pela televisão
empobrece sem dúvida alguma, a reprodução da vida, reduzindo-a a um
agrupamento de cenas-padrão (MARCONDES FILHO, 1988, p. 44).
As representações do público feminino são
limitadas ao ideal da “mulher perfeita”, sempre bela, frágil e sedutora,
sendo as aparências muito semelhantes e os padrões corporais persistentes.
As críticas à aceitação feminina a esses padrões não podem ser
desconsideradas, no entanto, é elaborado um processo quanto à linguagem e
técnica da mídia, especialmente para convencer e manipular. É nesse contexto
que se verifica o porquê do público feminino ser tão atingido em sua
identidade e a mulher ser comparada a uma mercadoria, em especial, na
publicidade de produtos predominantemente masculinos como propagandas de
cerveja e automóveis.
Segundo Campelo (1996), o século XX possibilitou
aos seres humanos registrar a imagem de seu próprio corpo, por meio de
imagens eletrônicas, dentre outras. Para ela a programação da TV é como um
texto referente a um “espelho eletrônico” ao qual as pessoas assistem
hipnotizadas. A imagem que é comercializada na TV é principalmente o corpo,
seja dos jornalistas, atores ou atrizes, o corpo deve estar impecável.
Nota-se o quanto o corpo é trabalhado nos meios de comunicação e como
predomina um ideal de corpo “perfeito” sugerido ao público jovem.
Bourdieu (1995) enfatiza a existência de uma "somatização
das relações de dominação", por meio da qual se inscrevem nos corpos dos
sujeitos dominados (mulheres) determinados gestos, posturas, disposições ou
marcas da sua subordinação. Diferentes processos de inculcação constroem a
imagem do ser mulher, o que colabora para a edificação de um modelo de corpo
padrão, assim como de atitudes e valores. Os meios de comunicação contribuem
com a inculcação ideológica apontada pelo autor, pois reafirmam as relações
de dominação ao determinarem um ideal de mulher, um ideal de corpo a ser
seguido.
Louro (2003) ao abordar o conceito de gênero
afirma que hoje não se trata mais de focalizar exclusivamente as mulheres
como objeto de estudo de pesquisa, mas sim os processos de formação da
feminilidade e da masculinidade, ou os sujeitos femininos e masculinos. O
conceito desenvolvido pela autora parece acenar também imediatamente para a
idéia de relação: os sujeitos se produzem em relação e na relação.
Por volta da década de 1920 o papel designado à
mulher era a preparação para ser uma dona de casa submissa, mãe exemplar
responsável pela educação dos filhos e os cuidados com o marido. Segundo
Priore (2001), nas escolas reproduzia-se e reforçava-se então a hierarquia
doméstica: as mulheres ficavam nas salas de aulas, executando as funções
mais imediatas do ensino, enquanto os homens dirigiam e controlavam todo o
sistema. A eles se recorria como instância superior, referência de poder;
sua presença era vista como necessária exatamente por se creditar à mulher
menos firmeza nas decisões, excesso de sentimento, tolerância, etc. Aos
homens eram encaminhados os alunos-problema ou qualquer questão que exigisse
a tomada de decisão de problemas mais graves. “Os mesmos princípios que
fazem da mãe educadora, fazem da mãe professora. Ambas participam do mesmo
movimento: o de conservação da (...) sociedade” (SFORNI, 2005, p. 318).
Os papéis atribuídos às jovens mulheres na
sociedade atual são bem mais amplos do que os referentes à década de 1920. A
imagem da mulher é construída a partir de atitudes que a tornam renovada,
como, por exemplo, assumir lideranças. No entanto, há que se destacar que
essa “mulher renovada” precisa estar dentro de alguns padrões: ser “uma
profissional”, estar “sempre bonita” e ser “independente”. Esse papel
feminino é reafirmado a todo o momento pelos meios de comunicação: a mulher
é vista como “independente” e “autônoma”, quando na verdade, embora agindo
dessa maneira, ela acaba seguindo padrões inculcados pelos meios de
comunicação e pela própria instituição escolar. A autonomia, a
independência, a profissionalização da mulher se, de um lado, são produto de
sua luta, é inegável, que de outro lado, é também produto da mídia. O artigo
“Inventário da existência feminina” escrito por Rosane Pavam, demonstra o
lado do combate enfrentado pela francesa Michelle Perrot que compôs a
história das mulheres no Ocidente em vários períodos.
Uma história feminina composta
apenas por homens é uma história de homens, como a dos troianos, uma versão
grega para os acontecimentos de Tróia. Por isso, essa intelectual advoga
para a mulher uma escrita própria, mesmo quando feita com os filhos no colo
e os cabelos bem cuidados (O ESTADO SÃO PAULO, 2007, p. 05).
De outro lado há todo um mecanismo de “violência
simbólica” (a inculcação dos valores) por trás de cada imagem, de cada
representação. Torna-se complexo afirmar que antigamente a mulher era
limitada enquanto hoje assume diversos papéis, sem antes verificar o
contexto histórico e como se deu essa transição. As próprias necessidades da
sociedade exigiram uma certa emancipação feminina nesse percurso histórico.
A imagem feminina foi sendo modificada e moldada à sociedade.
É indubitável que se queremos
encontrar o passado das mulheres devemos questionar e indagar em áreas “não
tradicionalmente históricas”; mas, profundamente, questionar porque as
mulheres estão ali, que relações de poder se estabelecem entre elas, como se
acham interconectadas com outros campos de poder e até que ponto uma
oposição (hierárquica) entre o público e o privado, pensada por homens das
classes dominantes, pode nos servir [...] (LOURO, 2003, p. 151).
Para a autora a mulher é representada por meio da
imagem que lhe é emprestada pelo papel social que exerce. Seja de interesse
próprio, ou não, é esse fator que acaba por lhe fornecer um maior ou menor
status social. Priore (2001) ressalta que é preciso compreender que
os discursos são representações e que podem ser distorcidas, sendo que são
essas representações que produzem um determinado ideal.
Então como as mulheres eram representadas? A
princípio, seu principal papel era o de ser mãe, dona de casa e professora.
Ao longo do século XX devido à necessidade da presença feminina em outros
pontos do mercado de trabalho foram atribuídos às mulheres outros papéis,
dentre eles, o de ser autônoma, consumidora. O autor Ghiraldelli Jr. (2002)
enfatiza que o sujeito consumidor referente ao liberalismo clássico com sua
identidade centrada na consciência não é o mesmo sujeito do século XX, pois
o “sujeito consumidor” atual tem sua “identidade pessoal” centralizada no
“corpo”.
Ocorre, então, um duplo movimento: o sujeito se reduz ao
corpo e a consumidor, e o próprio corpo se transforma em objeto de consumo,
de modo que, no limite, o sujeito se torna objeto. O sujeito é, então este
estranho elemento: corpo-que-consome-corpo (GHIRALDELLI JR, 2002, p. 37).
Verifica-se uma padronização crescente do
comportamento social, cultural e sexual feminino na sociedade contemporânea
veiculada pela ideologia consumista como uma forma de a produção capitalista
manter sua hegemonia econômica e cultural. O corpo da mulher, cada vez mais
é visto como sensual e objeto desejado que gera prazer.
3.
Como a jovem mulher é representada na revista Capricho e no programa
Malhação?
Para análise da construção da identidade feminina,
por meio da mídia, foram selecionadas duas fontes: revista “Capricho” e
programa “Malhação”. A revista “Capricho” é conhecida por suas reportagens
sobre o meio artístico, as dicas de beleza, cortes de cabelos, testes para
descobrir como prender um namorado, horóscopos, dentre outros itens
publicitários. O programa “Malhação”, da rede Globo é uma telenovela feita
para o jovem (maior parte de seu público).
O programa traz quadros que parecem “dinâmicos”,
que estão em constante mudança, como jogos, conflitos amorosos, problemas no
colégio, moda, comportamento, valores e preconceitos, sendo esses temas
abordados em um tempo ultraligeiro, com cenas que variam de 12 segundos a 2
minutos, aproximadamente. Ambas as fontes são amostras bem sucedidas
mercadologicamente.
Segundo Castro (1993), a Capricho foi lançada como
revista de foto novela em 1952, sendo considerada, na década de 1960/70, a
maior revista feminina da América do Sul. Os primeiros números tinham como
seções fixas: Contos, Psicologia, Moda e beleza, Vida e atualidades, Fatos
reais e Variedades. Em 1954, alguns testes de conhecimento propostos pela
revista às suas leitoras, demonstravam a importância dada ao estereótipo da
dona de casa, justamente com o papel social que a sociedade da época exigia
da mulher. Ao comparar esse estereótipo feminino com os existentes no
exemplar da revista do ano de 2004, nota-se diferença significativa quanto
ao papel associado à jovem mulher, sendo agora uma profissional que se
destaca pela sua beleza e “ascensão social”.
Hoje a revista já tem uma fórmula
consolidada, assumindo uma preocupação com o encorajamento da adolescente
para que se descubra e desenvolva sua auto-confiança, numa direção que
podemos chamar “educativa” em todos os assuntos tratados, desde moda- que
manteve a coluna fixa chamada “Certo e errado” , onde expõe-se fotos de
pessoas, tiradas na rua, com indicações do que é correto e do que não é –
até o relacionamento afetivo (CASTRO, 1993, p. 25).
Na revista Capricho de 08 de agosto do ano de
2004, constata-se que as imagens são as informações predominantes em todo o
volume. Os textos são na maioria pequenos e fragmentados e recebem destaque
com cores atrativas. A análise de outros exemplares da mesma revista mostra
que essa disposição gráfica se mantém, diferenciando-se apenas a ordem dos
tópicos e algumas cores. O número em foco, em sua capa, apresenta um
percentual de imagem de aproximadamente 90%, e 10% do espaço compõe a parte
escrita. Há quatro tópicos que acompanham a mesma cor do título (laranja),
sendo que a disposição da imagem da pessoa retratada é focalizada em seu
rosto, o que transmite uma idéia do modelo de “homem desejado” pelas jovens
mulheres. É interessante ressaltar que o jovem estampado nesta revista é o
protagonista do programa Malhação, referente ao episódio analisado (2004).
Ao folhear um novo exemplar da revista Capricho,
de 29 de março de 2007, nota-se que os recursos gráficos se mantém, assim
como os principais tópicos. A diferença se constitui aparentemente na capa,
pois apresenta o “casal sucesso” Alemão e Íris do BigBrother Brasil
2007 (reality show da rede Globo).
Destaca-se também a “matéria exclusiva com
o cantor americano Justin Timberlake, tendências da moda para outono/inverno
e a vida das garotas da Febem”. A similaridade entre ambas as revistas
consiste no fato de destacarem como “capas” artistas da Rede Globo
considerados celebridades, modelos de homens almejados pelo público
feminino.
Segundo Collaro (1987), a diagramação é um dos
mecanismos utilizados nas revistas para chamar a atenção do receptor.
Constitui-se o discurso gráfico que destaca a notícia com mais ou menos
intensidade, é um recurso funcional e estético da revista, pois enquadra a
notícia em um padrão, um olhar médio que não choque o leitor que busca
distinguir com maior facilidade o anúncio. A diagramação é perceptível em
todo o discurso da Capricho. Suas capas são caracterizadas por uma
fotografia de um jovem famoso da televisão, e se utiliza desses critérios de
diagramação para convencer e induzir o público a consumir o que está
exposto.
Ao abordar os princípios práticos de diagramação,
ressalta que a estética não é o fator mais importante num impresso, no
entanto, é responsável pelo primeiro impacto do leitor, por isso há a
necessidade do projetista estar atento a todo o tipo de comunicação visual
para que haja interesse por parte do leitor.
A diagramação desenvolve o seu
trabalho com vistas à disposição da matéria levando em conta o
aproveitamento do texto, o destaque, a atração, a forma, a estética,
conjugando o conteúdo com a apresentação gráfica (COLLARO, 1987, p. 87).
O episódio do programa Malhação referente ao dia
10 de agosto de 2004 contém um total de cenas de 24 minutos e propagandas de
5 minutos e 20 segundos; apresentando 82,3% de cena, aproximadamente -
incluso as vinhetas e o anúncio da próxima chamada – e 17,7% de publicidade
com um total 29 minutos e 20 segundos. Esse episódio apresenta corpos
esculpidos, relacionamentos em crise, mocinha boa versus mocinha má
que disputam o amor do protagonista “rebelde”.
Ao comparar a publicidade do programa Malhação com
a revista Capricho nota-se grande semelhança, pois o público que estes meios
de comunicação procuram abarcar são da mesma faixa etária (jovens,
adolescentes). Nas duas fontes observa-se a uma exaltação do ser jovem, um
culto ao corpo e uma exploração da imagem feminina. Um exemplo a ser
considerado é o clima de disputa entre duas jovens que desejam liderar a
equipe do jogo de handebol na aula de Educação Física. Essa disputa inclui
também o jovem técnico da equipe, pois ambas estão apaixonadas pelo mesmo.
Interessante destacar que o exemplar analisado da Capricho traz em sua capa
esse “jovem técnico da equipe” que expõe sua vida pessoal, fala da
experiência de ser o protagonista de Malhação e deixa no ar um exemplo de
bom moço, o homem idealizado pelas jovens.
Tanto as jovens que são retratadas em Malhação
como as jovens expostas na revista Capricho são representadas por meio de um
estereótipo de corpos esculpidos, de estar na moda, de ser “boazinha”.
Existem papéis diferentes associados a essas jovens, mas o fator comum é que
tanto a jovem considerada padrão quanto a rebelde devem estar dentro do
padrão de beleza.
Segundo dados da revista Época apresentados por
Martha Mendonça, em 18 de outubro de 2004, Malhação, a série teen da
Rede Globo, que está a quase 10 anos no ar, vive uma de suas melhores fases,
pois “em 2003, teve 29 pontos de média e 58% de share (porcentagem de
aparelhos ligados na Globo no horário)”. A reportagem mostra que a seleção
de temas ligados à vida dos jovens retratados pelos personagens é um dos
motivos de manter-se por esse período no ar. “Assuntos como AIDS,
virgindade, drogas, pais separados, aborto, gravidez na adolescência ou uso
de anabolizantes estão presentes no dia a dia da novelinha, o único programa
da dramaturgia da emissora que não tem férias ou intervalos e vai trocando
parte dos autores a cada nova fase” (p. 116). No ano de 2004, Malhação
alcançou 34 pontos de audiência e 66% de share, cerca de 21 milhões de
telespectadores.
Atualmente, o programa tem abordado os mesmos
valores, os mesmos ideais, os mesmos corpos. No episódio referente ao dia 06
de abril de 2007, parece evidente o preconceito em relação a uma jovem
mulher (bonita) professora de mecânica: em sua aula comparecem apenas dois
alunos que confessam que os demais não apareceram por acreditarem que
“mulher e mecânica não combinam”. Embora, aparentemente o programa procure
desvelar o preconceito referente aos papéis atribuídos às jovens mulheres,
nota-se uma posição esperada (padronizada) dos rapazes.
Nos intervalos do programa Malhação as propagandas
são relacionadas ao público que o assiste, que em grande parte são jovens.
Os produtos propagandeados na revista Capricho são em grande parte
apresentados nas chamadas dos intervalos do programa, como cremes para a
pele e os cabelos, o vestuário dos jovens, calçados, o que está na moda, sua
alimentação, dentre outros.
Campelo (1996) verifica que inexiste a
neutralidade quanto às escolhas das imagens que a todo instante circundam a
sociedade. Os meios de comunicação se apropriam de conhecimentos capazes de
atingir o público de forma a persuadi-lo. Tudo na mídia pode ser visto como
um produto a ser consumido de alguma maneira.
A partir dos dados apresentados convém refletir
sobre a padronização do comportamento do público trabalhada pela mídia,
tanto no meio impresso como televisivo isso fica cada vez mais nítido
observando como esse jovem se comporta no seu núcleo social e, em especial,
na sala de aula. A mídia estuda minuciosamente o seu público a fim de
procurar satisfazer suas aspirações que muitas vezes são desejos e
necessidades impostas de fora para dentro, criando ilusões. Busca-se,
portanto na compra do produto ou idéia a realização dos seus desejos.
Para tanto, a instituição escolar, as teorias
educacionais deveriam favorecer as condições de conscientização, mas não
apenas no âmbito intelectual, pois é de extrema importância que o estudo do
corpo - construído socialmente e culturalmente - seja introduzido nesse
processo.
4.
Considerações finais
O objetivo da indústria cultural é padronizar,
formar e educar cidadãos aptos a manterem o sistema vigente, no entanto, não
se pode generalizar que todos os indivíduos recebem a mensagem da mesma
forma. Adorno (1993) vê a cultura como mercadoria numa sociedade de consumo,
tanto para o fabricante, como para o consumidor, enquanto Morin (1975) chama
a atenção à “dimensão simbólica” contida nos conteúdos dos produtos
culturais que não podem ser analisados da mesma forma que as demais
mercadorias produzidas pela indústria de bens de consumo.
As fontes analisadas são exemplos de como a
estratégia mercadológica está sempre em busca do “novo” e do “belo” para
convencer o leitor a estar sempre consumindo o que é produzido por esses
meios, como também seguir o modelo estabelecido. É nesse contexto que se
pode identificar como a educação proposta às mulheres é também reproduzida
pela mídia, sem que essas a questionem. Nesse estereótipo midiático está
como essa mulher deve comportar-se, vestir-se, enfim, agir de uma forma
pré-estabelecida.
Castro (1993) não exclui as análises dos
frankfurtianos quanto à indústria cultural, no entanto, afirma que deve
haver uma relação quanto à idéia do receptor passivo colocada pela escola,
ou seja, por mais que a indústria cultural seja considerada um meio de
alienação, ela também pode ser entendida como um fator que pode beneficiar o
desenvolvimento do homem. Um exemplo é que o acúmulo de informação acaba por
transformar-se em formação dos indivíduos, mesmo não sendo um conhecimento
sistematizado, permite a maioria dos indivíduos obterem informações sobre o
mundo. Por esse motivo, a autora enfatiza a posição de Morin (1975) quanto à
cultura não considerada inteiramente como mercadoria, até mesmo porque
existem produtos que trazem conteúdos simbólicos que são decodificados de
forma diferente por cada receptor.
É nesse contexto que a observação de cada
indivíduo sob determinada imagem é analisada pela sua cultura, pelo que
conseguiu abstrair da mensagem imagética. “O simples fato de designar
unidades, de recortar a mensagem em unidades passíveis de denominação,
remete ao nosso modo de percepção e de recorte do real em unidades
culturais” (Joly, 1996, p. 73). É ilusão acreditar estar bem informado a
partir de uma só visão sobre determinado assunto, há todo um processo
subjetivo por trás dos discursos informativos que são ordenados pela
imprensa.
Atualmente, a leitura jovem está mais voltada a
uma sedução visual, imagens que trabalham com estereótipos corporais. Sendo
assim, a jovem se espelha em um dos personagens criados pela mídia, ou em
uma jovem famosa estampada na capa de revistas destinadas a esse público,
como foram identificados diversos fatores que comprovam uma proposta de
identidade social.
Em ambas as fontes não se podem desconsiderar o
fato da mulher ter conquistado um espaço maior durante o percurso de sua
história. É importante compreender que esse espaço foi construído de acordo
com as necessidades de cada momento histórico que apontaram quais os papéis
que deveriam ser desempenhados pela mulher no decorrer de sua história.
Almeida (2006) enfatiza a atuação tanto da mulher
quanto do homem no âmbito escolar como compromisso de assegurar os direitos
à plena cidadania. Para tanto, há a necessidade de trilhar um caminho sem
assumir uma determinada “postura interpretativa”, ou seja, uma postura
padrão, mas sim, buscar compreender o porquê dos posicionamentos históricos,
culturais, sociais, políticos e educacionais dos indivíduos atuantes em
determinado contexto histórico que reflete nos dias atuais.
Dentro dessa perspectiva, a escola
deverá ser caracterizada por uma pedagogia que demonstre seu compromisso em
levar em conta as concepções e os problemas que afetam profundamente os
estudantes e suas vidas diárias. Igualmente importante é a necessidade da
escola cultivar um espírito de crítica e um respeito pela dignidade humana
que sejam capazes de associar questões pessoais e sociais em torno do
projeto pedagógico de ajudar os alunos a se tornarem cidadãos críticos e
ativos. (GIROUX, 1988, p. 102).
O fato de ressaltar o papel designado a jovem
mulher não exclui que a figura masculina também é explorada por esses meios
e que ambos são inseridos no processo de inculcação da “violência
simbólica”. O intuito desse trabalho é buscar no âmbito educacional
elementos que possam contribuir para um estudo melhor sistematizado acerca
das questões levantadas sobre os meios de comunicação como uma forma de
padronização, de modo que, haja uma educação emancipatória a todos os
indivíduos, independente de classe, sexo, etnia e sexualidade.
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