Ano I - Nº 01 - Maio de 2001 - Bimensal - Maringá - PR - Brasil - ISSN 1519.6178
Criminologia da Privatização
Ensaio baseado em Psicopatologia
Criminal
Sabemos que duas alavancas movem a
humanidade: o INTERESSE e o MEDO.
EMENTA: (1) Demonstrar que os políticos envolvidos na
privatização, muito provavelmente, são subornados através dos paraísos fiscais;
(2) Provar que no Brasil não há
liberdade nem democracia e os direitos humanos não são respeitados.
1.0. - O FATO
Verifica-se facilmente o caráter
criminógeno da privatização. Basta lembrar que:-
1.ª) Uma das causas imediatas da
miséria do povo brasileiro é a revoltante concentração de renda em mãos de
poucos privilegiados;
2.ª) Ora, a privatização das estatais
agrava a concentração de renda.
LOGO, a privatização torna o povo ainda mais
miserável.
2.0. - MOTIVAÇÃO
Sob o ponto de vista psicopatológico,
é lícito deduzir que os defensores da privatização sejam motivados por um (ou
mais) dos seguintes fatores, relacionados pela ordem de probabilidade:-
1.º) INTERESSE:- O valor das estatais,
em dinheiro, é astronômico; portanto, as «comissões» (ou propinas) são também
muito elevadas. É evidente que são pagas mediante depósitos em contas numeradas
nos paraísos fiscais.
2.º) IDEALISMO OU INGENUIDADE:- Dos
que acreditam que o neoliberalismo defende as liberdades democráticas.
3.º) MEDO:- De serem acusados de
alinhamento com os «populistas» ou «subversivos», expressões pejorativas para
rotular os defensores do povo.
3.0. - DIAGNÓSTICO
Para elidir a fortíssima suspeita que pesa sobre os defensores da
privatização, basta que autorizem quebra do sigilo bancário, no Brasil e no
Exterior, incluindo os paraísos fiscais, não somente deles como dos familiares
e prepostos, com ampla divulgação dos extratos.
Aqui se incluem o Presidente Fernando
Henrique Cardoso, Ministros de Estado,
Governadores e Secretários do Planejamento, senadores, deputados, diretores do
Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social, funcionários do Executivo
que comandam o programa nacional de desestatização, bem como outros com poder
decisório sobre a matéria.
Os que recusarem quebra do sigilo
bancário estarão, ipso facto, confessando participação no esquema de
corrupção.
x-x-x-x-x
No que tange ao idealismo, a questão é
mais profunda, mas o resultado igualmente visível.
Sabemos que o Direito Natural, de onde
emanam os direitos humanos, resulta de
leis biológicas:- é o direito de usufruir tudo o que a natureza humana requer
para o homem viver dignamente. Sendo ele composto de corpo e alma, suas
necessidades incluem bens materiais e espirituais.
Vejamos como a Enciclopédia do
Advogado, de Leib Soibelman, define a matéria em foco:-
LEI
NATURAL. - Lei moral, direito natural, razão natural. Opõe-se à lei positiva,
feita pelos homens.
Na hierarquia de valores, a dedução é
evidente:- o Direito Natural foi criado pela Lei Natural, ou seja, pelas leis
biológicas. Portanto, deriva da Natureza do Homem, e não das leis positivas,
geralmente ditadas pelo egoísmo de deputados e senadores, originando “estado de
direito” opressivo.
Em conseqüência, sempre que os
princípios da Lei Natural forem ignorados ou contrariados pela lei positiva,
esta será eticamente «ilegal» e desumana. Assim sendo, não lhe devemos
obediência, a não ser pelo direito da força, ou seja, a coerção imposta
pelo Estado.
4.0. - REALIDADE
A Lei Natural não é respeitada no
Brasil. Exemplificando:- os direitos naturais à vida, à alimentação, ao vestuário
e moradia, à educação e saúde, e principalmente o direito ao trabalho
não existem, na prática, para muitos milhões de brasileiros.
«Mas a Constituição assegura esses
direitos», dirão alguns.
Sim, mas somente no plano teórico. Na
realidade, a Constituição não impõe, não garante o exercício desses direitos.
Surge, então, a inevitável indagação:-
QUAL A UTILIDADE DE UM
DIREITO QUE EU TENHO MAS NÃO POSSO EXERCER?
A Constituição assegura também o
direito à liberdade.
QUE LIBERDADE É ESSA, SE EU
NÃO SOU LIVRE NEM MESMO PARA USUFRUIR MEUS DIREITOS NATURAIS?
O direito à moradia
é um capítulo dramático, doloroso. Que o digam os moradores em favelas e
cortiços, quando não na rua, bem como os que são compelidos a pagar aluguel
extorsivo.
Deixamos de lado o direito ao lazer,
pois seria cômico analisá-lo.
O trabalho é direito natural porque
sem ele faltarão os meios de subsistência.
Dirão os neoliberais:- O governo
fornece salário desemprego.
Sim, em alguns casos, mas mesmo nesta
hipótese não consegue saciar a fome do espírito, conseqüente da ociosidade
forçada, que acaba gerando problemas psiquiátricos. Entre estes o alcoolismo é
comum, embora não seja o mais grave.
A saúde, no Brasil, não passa de
monstruosa quimera constitucional:- a medicina está quase totalmente
mercantilizada nos convênios e os hospitais públicos são ultrajantes.
Não é necessário prosseguir nesta
linha de raciocínio. O que dissemos torna obrigatória a conclusão:-
5. - CONCLUSÃO
Se não somos todos livres para
vivenciar nossos direitos naturais, a conclusão imperativa é a de que, em nossa
terra, não há liberdade.
Finalizando:-
Enquanto houver um só brasileiro que
não possa exercer, efetiva e livremente, o seu direito ao trabalho, poderemos
proclamar em alto brado:-
NÃO HÁ LIBERDADE NO BRASIL.
O mesmo se diga em relação a todos os
direitos naturais.
6. - DEFINIÇÃO DE LIBERDADE
Resulta do exposto que, em termos
axiológicos, podemos afirmar:-
Liberdade
consiste no efetivo exercício dos direitos humanos, ou naturais, por todos os
seres humanos.
Fica plenamente provado, portanto, que
o neoliberalismo não defende nem promove a liberdade. Protege apenas os
interesses da classe dominante, que se torna gradualmente mais rica, em
prejuízo do povo, cada vez mais pobre.
Caem por terra, pois, os argumentos
básicos utilizados em defesa da privatização.
7. - ESTATAIS INEFICIENTES?
Sim, em vários casos. Entre os mais
berrantes estão as ferrovias (trens de subúrbio, inclusive). Por que?
Elas foram sucateadas para favorecer
os empresários fabricantes de ônibus, caminhões e veículos de passageiros, bem
como aviltar seu valor nos trâmites da privatização. Muita propina deve ter
corrido, e certamente ainda corre, em âmbito ministerial. Lembrando que o país
não é auto suficiente em petróleo, o crime assume proporções ainda maiores.
É oportuno recordar que os diretores
das estatais são nomeados pelo governo neoliberal, com o objetivo evidente de
torná-las ineficientes e deficitárias, alem de transformá-las em cabide de
empregos para "altos" funcionários, regiamente remunerados. Cria-se,
assim, um clamor popular de apoio ao propósito governamental de entregá-las ao
setor privado.
No que tange aos bancos, convém
lembrar que os oficiais destinam-se a promover o bem comum. Mas como são
dirigidos por neoliberais escolhidos pelo governo, tornam-se instrumentos de
corrupção (vários exemplos recentes). Os bancos privados têm finalidade
diferente:- em 1.º lugar o lucro, em 2.º contribuir para o fortalecimento
econômico da classe dominante. O povo não tem lugar, a não ser como vítima do
processo espoliativo.
Aconselharam-nos a divulgar, pela
imprensa, o que sucintamente ponderamos. Infelizmente, não é possível. Por quê?
Vejamos.
8. - LIBERDADE DE IMPRENSA - TRISTE VERDADE.
Liberdade de imprensa é pura falácia,
tanto no Brasil como em todo o mundo neocapitalista. Os jornais só podem
publicar o que interessa ao empresariado. Se denunciarem os delitos cometidos
contra o povo, perderão os grandes anunciantes e irão à falência. O mesmo se
diga em relação a todos os meios de comunicação social. Portanto, a imprensa
não é livre.
Finalizando, convém lembrar que o
Brasil não é e nunca foi democracia. Com efeito, não
passa de uma odiosa plutocracia, ou seja, um país
governado pelos ricos.
* Médico, lecionou Psicopatologia
Criminal e Psiquiatria Forense no Departamento de Medicina Legal da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo, quando titular o pranteado Professor
Armando Canger Rodrigues.