por VANDERLEI AMBONI

Professor do Departamento de História da Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí, Graduado em Ciências pela FAFIMAN e História pela UEM. Especialista em Sociologia e em Formulação e Gestão de Políticas Públicas, ambas pela UEM e Mestre em Educação (UEM)

 

 

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Gestão democrática e controle social dos recursos financeiros destinados às escolas estaduais do Paraná

Vanderlei Amboni*

Resumo

O presente trabalho tem por objetivo mostrar as práticas de gestões democráticas nas escolas, promovidas de acordo com a legislação, bem como a criação dos Conselhos Escolares e o desenvolvimento do controle interno no processo de gestão dos recursos financeiros nas escolas do Estado do Paraná, com a descentralização implantada pelo Instituto de Desenvolvimento Educacional do Paraná - Fundepar, após a criação do fundo rotativo, ocorrido em 1992. Faz uma discussão sobre os aspectos que permeiam as relações sociais no interior das escolas, sua luta pela construção de colegiados com poder de deliberação e formas de participação popular para consolidar a democracia escolar, bem como a busca pela plena autonomia de gestão financeira. Outro aspecto demonstrado é a forma de distribuição de recursos financeiros para as escolas, via Fundo Rotativo, e o controle exercido pela Fundepar junto às instituições de ensino.

Palavras-chave: fundo rotativo, controle, gestão democrática, conselho escolar.

Abstract

The objective of the present work is to show the practices of democratic management in the schools, promoted according to the legislation, as well as the creation of school councils and the development of internal control in the process of financial resources management in the schools of Paraná State, with the decentralization implanted by the institute of Educational development of Paraná - Fundepar, after the creation of the Rotative Funds, occurred in 1992. It makes a discussion about the aspects that permeate the social relations in the interior of schools, its struggle for the construction of councils who have the power of deliberation and forms of popular participation in order to consolidate the school democracy, as well as the search by entire autonomy of financial management. Another aspect demonstrated is the financial resources distribution to the schools, by the Rotative Fund and the control performed by Fundepar aside to teachings institutions.

Key words: Rotative Fund, control, democratic management, school council.

 

Introdução

A partir da democratização do Brasil, o Estado Brasileiro foi coroado com uma Constituição Federal que direciona o Estado para a democracia e uma descentralização tributária para os estados e municípios. A sociedade civil passou a ter maior inserção na vida política, ganhando mobilidade e participação junto às instituições públicas. A cidadania teve uma expressiva expansão com a Constituição de 1988, pois, além dos direitos políticos, civis e sociais, foram incluídos direitos coletivos e difusos.

Analisando o processo de descentralização do poder político e financeiro do Estado Brasileiro promulgado pela Constituição de 1988, Souza (2001, p. 1) afirma:

A Constituição de 1988 desenhou uma ordem institucional e federativa distinta da anterior. Voltada para a legitimação da democracia, os constituintes de 88 optaram por duas principais estratégias para construí-la: a abertura para a participação popular e societal e o compromisso com a descentralização tributária para estados e municípios. Da primeira estratégia resultou uma engenharia constitucional consociativa em que prevaleceu a busca de consenso e a incorporação das demandas das minorias. A segunda moldou um novo federalismo, tornando-o uma das mais importantes bases da democracia reconstruída em 1988.

Santos e Gama (2004, p. 435) destacam:

A descentralização constitui uma inovação na estrutura do poder político, uma estratégia para conferir legitimidade ao poder público. O êxito desse processo depende, entretanto, da existência de instrumentos de controle externo do Estado, seja pela disseminação da cultura de participação popular, seja pela criação de instituições voltadas para esse fim.

A descentralização política e financeira, consolidada na Carta Magna de 1988, permitiu a democratização no interior das escolas, com eleições diretas para diretores e a criação de Conselhos Escolares, como parte do processo democrático, mas criou, também, a responsabilidade na aplicação e controle dos recursos financeiros descentralizados, como parte integrante do Estado.

Nesse processo deve-se observar o contido no artigo 37 da Constituição Federal, o qual estabelece que:

A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

O princípio da eficiência foi inserido pela Emenda Constitucional n.º 19, de 04 de junho de 1998. Esse princípio, segundo Pires e Motta (2006, p. 10), “traduz a idéia de presteza, rendimento funcional, responsabilidade no cumprimento de deveres impostos a qualquer agente político”.

A criação do Conselho Escolar traz para o interior das Escolas Públicas do Paraná a possibilidade de democratizar as estruturas do poder escolar, pois permite a seus agentes a formulação de políticas de interesses locais, estabelecendo um processo de diálogo com a comunidade escolar, fazendo valer os direitos constitucionais de sua comunidade. A democracia, a liberdade, e a autonomia plena são um processo de conquista conjunta, coletiva da sociedade que se organiza e se insere como sujeito da história. Ou seja, traz a participação de pais para a formulação e gestão, pedagógica e financeira da escola pública. Todavia esse processo necessita, ainda, de maior democratização do poder escolar permitindo a participação e tomada de decisão por toda a comunidade. “Dessa forma, diretores, professores, pais de alunos, merendeiras etc., enfim, toda a comunidade escolar tem direito a voz e voto nos conselhos de escola e em outras instâncias políticas. Ou seja, é uma escola do povo e para o povo” (GASPARELLO, s/d, p. 14).

Para Freire apud Gasparello (2000, p. 75) a criação do Conselho Escolar se justifica porque:

Para nós, a participação não pode ser reduzida a uma pura colaboração que setores populacionais devessem e pudessem dar à administração pública. Participação ou colaboração, por exemplo, através dos chamados mutirões por meio dos quais se reparam escolas, creches, ou se limpam ruas ou praças. A participação, para nós, sem negar este tipo de colaboração, vai mais além. Implica, por parte das classes populares, um “estar presente na história e não simplesmente estar nela representadas”. Implica a participação política das classes populares através de suas representações no nível das opções, das decisões e não só do fazer o já programado. Por isso é que uma compreensão autoritária da participação a reduz, obviamente, a uma presença concedida das classes populares a certos momentos da administração. Para nós, também, é que os conselhos de escola têm uma real importância enquanto verdadeira instância de poder na criação de uma escola diferente. Participação popular para nós não é um slogan mas a expressão e, ao mesmo tempo, o caminho da realização democrática.

Cumpre nesse processo que a tarefa de ensino-aprendizagem une-se à capacidade intelectual de seus atores, para formar uma organização do trabalho escolar com qualidade e, ao mesmo tempo, com caráter participativo e representativo, assegurando a gestão democrática da escola como um princípio para a construção da solidariedade humana. Por isso, é importante considerar a escola como uma unidade histórico-social formada por grupos humanos intencionalmente constituídos e em contradição entre si, que produzem hegemonia de um grupo sobre outro.

Sobre isso, afirma Forquim (1993, p. 167):

A escola é, também um mundo social que tem suas características de vida próprias, seus ritmos e seus ritos, sua linguagem, seu imaginário, seus modos próprios de regulação e transgressão, seu regime próprio de produção e de gestão de símbolos.

Partindo do entendimento dessa realidade, pode-se vislumbrar uma gestão escolar em que a participação dos segmentos que a compõem, no processo de tomada de decisões articulados aos interesses da sociedade e no funcionamento da organização escolar representativa, é fundamental para uma gestão efetivamente democrática.

Nesse sentido, Paro (1996, p. 151) postula que:

A possibilidade de uma administração democrática no sentido de sua articulação, na forma e conteúdo, com os interesses da sociedade como um todo, tem a ver com os fins e a natureza da coisa administrada. No caso da Administração Escolar, sua especificidade deriva, pois: a) dos objetivos que se buscam alcançar com a escola; b) da natureza do processo que envolve essa busca. Esses dois aspectos não estão de modo nenhum desvinculados um do outro. A apropriação do saber e o desenvolvimento da consciência crítica, como objetivos de uma educação transformadora, determinam (...) a própria natureza peculiar do processo pedagógico escolar; ou seja, esse processo não se constitui em mera diferenciação do processo de produção material que tem lugar na empresa, mas deriva sua especificidade de objetivos (educacionais) peculiares, objetivos estes articulados com os interesses sociais mais amplos e que são, por isso, antagônicos aos objetivos de dominação subjacentes à atividade produtiva capitalista.

Na esfera da educação há, portanto, uma possibilidade do sujeito (aluno) construir uma consciência crítica de sua realidade histórica, cuja natureza reside na articulação dos objetivos educacionais propostos pela Escola com os interesses sociais. Aponta Paro (1996), que a educação se constitui em agente que pode congregar princípios de emancipação do homem frente à sociedade capitalista.

Escola e democracia

Conselho Escolar: a construção da democracia na escola

No final da década de 1970, começa a ganhar força a idéia da criação de conselhos escolares com o objetivo de democratizar as relações de poder no interior das escolas. A inclusão do inciso VI do artigo 206 na Constituição Federal de 1988, o qual estabelece a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei”, garante dessa forma a organização democrática no interior da escola brasileira. Ou seja, permite a gestão e o controle dos gastos públicos com a manutenção da escola, através de um órgão independente e acima do administrador, mas ligado a sua estrutura.

O Conselho Escolar é o órgão máximo de direção nas Escolas Públicas do Paraná, cujo poder gravita na democratização das relações institucionais. A LDB de 1996 reafirma no Artigo 3º, inciso VIII o mesmo princípio da “gestão democrática do ensino público”.

No Paraná, o Conselho Estadual de Educação - CEE instituiu os Conselhos de Escola, através da Deliberação 020/91, estabelecendo que “todas as escolas devem ter um órgão máximo de decisões coletivas, o colegiado, que deve abranger representação de toda a comunidade escolar, reforçando o princípio constitucional da democracia”.

A Secretaria de Estado da Educação - SEED baixou a Resolução nº 4.839/94 — legitimando as normas contidas na Deliberação nº 020/91, já mencionada —, que aprova os regimentos escolares da Rede Pública Estadual, nos quais constam as normas de funcionamento dos Conselhos Escolares do Paraná. A posteriori, essas normas foram revogadas e substituídas pela Deliberação 16/99 do CEE e Resolução 2.122/00-SEED. Em 2005, a SEED baixou a Resolução nº 2.124/05, “que orienta a análise e aprovação do novo Estatuto do Conselho Escolar para a Rede Pública Estadual” para “fortalecer a construção da cultura democrática rompendo com a cultura autoritária e centralizadora de educação” (Paraná, 2005, p. 6).

O Conselho Escolar instituído pela legislação estadual é um colegiado formado por todos os segmentos da comunidade escolar: pais, alunos, professores, direção, equipe pedagógica e funcionários administrativos e serviços gerais, além do representante do grêmio estudantil e dos movimentos sociais organizados. Através do Conselho Escolar, todas as pessoas ligadas à escola se fazem representar e decidem sobre aspectos administrativos, financeiros e pedagógicos, tornando este colegiado não só um canal de participação, mas também um instrumento de gestão da própria escola. Isso permite dizer que as contradições que existem na sociedade passam a ser discutidas no interior das escolas, pois os interesses de determinados grupos passam a potencializar os debates educacionais na construção da escola que se quer ver edificada e se apresentam de maneira concreta no projeto político-pedagógico. Portanto, o Conselho Escolar é uma instituição que, perante a lei, deveria coordenar a gestão escolar no seu dia-a-dia, mas na prática se submete à vontade do diretor. Ou seja, o Conselho deveria ser o órgão responsável pelo estudo e planejamento, debate e deliberação, acompanhamento, controle e avaliação das principais ações da escola, tanto no campo pedagógico, como no administrativo e financeiro.

Segundo Ciseski e Romão (2004, p. 66):

O Conselho de Escola — um colegiado formado por pais, alunos, professores, diretor, pessoal administrativo e operacional para gerir coletivamente a escola — pode ser um espaço de construção do projeto de escola voltado aos interesses da comunidade que dela se serve. Através dele, a população poderá controlar a qualidade de um serviço prestado pelo Estado, definindo e acompanhando a educação que lhe é oferecida.

Tomando posição Romão (2004, p. 29) afirma que:

A instituição de coletivos nas escolas apresenta-se, dialeticamente, como uma instância mediadora que é, ao mesmo tempo, um mecanismo de absorção das tensões e dos conflitos de interesses e um instrumento potencial de inovação e transformação, na medida em que abre espaço para a explicitação daquelas tensões e conflitos represados, camuflados ou inibidos....

No Estado do Paraná, o Estatuto do Conselho Escolar estabelecido pela Resolução 2124/05, em seu artigo 4º estabelece que:

O Conselho Escolar é um órgão colegiado, representativo da Comunidade Escolar, de natureza deliberativa, consultiva, avaliativa e fiscalizadora, sobre a organização e realização do trabalho pedagógico e administrativo da instituição escolar em conformidade com as políticas e diretrizes educacionais da SEED, observando a Constituição, a LDB, o ECA, o Projeto Político Pedagógico e o Regimento da Escola/Colégio, para o cumprimento da função social e especifica da ESCOLA

§ 1º A função deliberativa, refere-se à tomada de decisões relativas às diretrizes e linhas gerais das ações pedagógicas, administrativas e financeiras quanto ao direcionamento das políticas públicas, desenvolvidas no âmbito escolar.

§ 2º A função consultiva refere-se à emissão de pareceres para dirimir dúvidas e tomar decisões quanto às questões pedagógicas, administrativas e financeiras, no âmbito de sua competência.

§ 3ºA função avaliativa refere-se ao acompanhamento sistemático das ações desenvolvidas pela unidade escolar, objetivando a identificação de problemas e alternativas para melhoria de seu desempenho, garantido o cumprimento das normas da escola bem como, a qualidade social da instituição escolar.

§ 4º A função fiscalizadora refere-se ao acompanhamento e fiscalização da gestão pedagógica, administrativa e financeira da unidade escolar, garantido a legitimidade de suas ações.

O Conselho Escolar, portanto, tem sua institucionalização, constituição e funcionamento determinados por lei, com definições específicas para, também, atuar na fiscalização da gestão financeira, isto é, exercer o controle social sobre a aplicação orçamentária da Instituição Escolar. Nesse Caso, “o Conselho vai muito além de apresentar propostas: ele decide, ele determina onde e como aplicar tais recursos” (CISESKI e ROMÃO, 2004, p. 71). Por receber dinheiro público, está submetido à Lei de Responsabilidade Fiscal, pois tem que emitir pareceres, acompanhar, fiscalizar e aprovar a gestão do dinheiro público no âmbito das escolas, “garantindo a legitimidade de suas ações”. Cumpre assim com a legislação em vigor, posto que:

A Lei de Responsabilidade Fiscal é um código de conduta para os administradores públicos de todo o país, que passa a valer para os três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal). Através dela, todos os governantes passaram a obedecer a normas e limites para administrar as finanças, prestando contas sobre quanto e como gastam os recursos da sociedade (www.gestaododinheiropublico.pr.gov.br, on-line, 2006).

O controle da sociedade sobre os atos da administração nasceu com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, na consolidação da Revolução Francesa, que, em seu artigo 15, estabeleceu a seguinte norma “a sociedade tem o direito de pedir a todo agente público contas de sua administração”. O passo está dado para que a sociedade possa, efetivamente, participar da construção de relações democráticas em todas as instituições sociais.

Nas instituições escolares do Estado do Paraná, cada comunidade escolar organizada passa a participar diretamente da gestão financeira e a ter o controle dos gastos públicos em seu interior. Para Meirelles apud Faccioni (s/d, p. 10), o “Controle Interno é todo aquele realizado pela entidade ou órgão responsável pela atividade controlada, no âmbito da própria Administração”. Para Viegas apud Moraes, (2006, p. 17) o controle tem uma “conotação positiva”, pois “[...] significa a capacidade de fazer com que as coisas ocorram exatamente como se deseja, como se foi previsto ou planejado [...]”, bem como a “[...] capacidade de impedir que as coisas aconteçam e que as pessoas ajam conforme elas desejem”.

O controle interno das organizações escolares do Estado do Paraná está expresso nas atribuições do Conselho Escolar, conforme incisos do Artigo 43, do seu Estatuto (2005, p. 18:19):

X – definir e aprovar o uso dos recursos destinados à escola mediante Planos de Aplicação, bem como prestação de contas desses recursos, em ação conjunta com a Associação de Pais, Mestres e Funcionários – APMF e,

XVIII – avaliar, periodicamente e sistematicamente, as informações referentes ao uso dos recursos financeiros, os serviços prestados pela Escola e resultados pedagógicos obtidos.

Esse processo ocorre com a participação dos pais nos conselhos escolares e nas Associações de Pais, Mestres e Funcionários - APMFs, cuja participação decorre de eleições no interior das escolas públicas do Paraná – EPPs, em número que assegura a igualdade entre os representantes das escolas e dos pais, junto ao Conselho Escolar.

Para esse fim, o artigo 30 do Estatuto do Conselho Escolar (2005, p. 15) estabelece:

O Conselho Escolar será um fórum permanente de debates, de articulação entre os vários setores da escola, tendo em vista o atendimento das necessidades educacionais e os encaminhamentos necessários à solução de questões pedagógicas, administrativas e financeiras, que possam interferir no funcionamento da mesma.

Reforça, portanto, o caráter democrático das forças sociais no interior das escolas, cuja democracia escolar é um prêmio à participação da comunidade escolar nas discussões de seus projetos, pois permite a construção da escola que se quer para si, cujo alicerce é a democracia e a participação popular. A instituição escolar se fortalece nesse processo. Dessa maneira Camargo e Adrião (2003, p. 30:31), objetivando a democracia, como princípio e método, afirmam:

Como princípio, articula-se ao da igualdade, proporcionando a todos os integrantes do processo participativo a condição de sujeito, expressa no seu reconhecimento enquanto interlocutor válido. (...) Como método, deve garantir a cada um dos participantes igual poder de interferência e decisão, criando mecanismos que facilitem a consolidação de iguais possibilidades de opção e ação diante dos processos decisórios.

É preciso, portanto, romper a apatia e a “montagem” de conselho escolar para dar uma falsa legitimidade às ações democráticas nas escolas, conforme denúncia de Paro (2005, p. 102), onde, segundo ele:

De modo como está instituído hoje em vários sistemas de ensino do país, o conselho de escola fica, quase sempre, na dependência da vontade política do diretor para funcionar adequadamente, de maneira a servir como veículo de democratização da escola. Embora, em termos legais, esse colegiado seja deliberativo e se coloque ao lado do diretor, fazendo parte (supostamente) da direção, o diretor de escola, premido pelas circunstâncias acima mencionadas, fazendo uso de sua autoridade como responsável último pela unidade escolar e diante da insuficiente pressão por participação da parte dos demais setores da escola, acaba por ‘montar’ ele próprio um conselho apenas formal e inoperante, que só decide questões marginais e sem importância significativa para os destinos da escola, ficando o diretor sozinho para tomar as decisões, já que sabe ser ele quem arcará com as responsabilidades.

Retirar das mãos dos diretores a formação dos conselhos escolares é uma decisão que cabe aos próprios atores da escola. Particularmente, no caso do Estado do Paraná, onde os diretores são “escolhidos” pela comunidade escolar, não se pode prescindir do conselho escolar para construir espaços de decisão coletiva e tornar a escola verdadeiramente espaço de aprendizagem e exercício de soberania popular, posto que uma criança, quando aprende o exercício de cidadania, buscará exercê-lo em sua totalidade. Portanto, cabe aos atuais atores a tomada de decisão, para que a sociedade tenha amanhã jovens cidadãos.

Gestão Democrática

A gestão escolar democrática permite o controle social dos gastos praticados pela Escola. As relações democráticas são determinantes para que o efetivo exercício de cidadania tenha sucesso no interior das instituições escolares, pois congrega todos os segmentos que compõem a Escola. Ou seja, traz para o processo de deliberação professores, funcionários administrativos e serviços gerais, membros da equipe pedagógica, pais, alunos e membros da sociedade civil organizada. As decisões tomadas pelo coletivo escolar tornam a escola um espaço de experiência e ação democratizante, conforme ensina Freire apud Gasparello (2000, p. 74):

No governo municipal, aproveito o poder que dele decorre para realizar, no mínimo, parte do velho sonho que me anima. O sonho de mudar a cara da escola. O sonho de democratizá-la, de superar o seu elitismo autoritário, o que só pode ser feito democraticamente. Imagine você se eu pretendesse superar o autoritarismo da escola autoritariamente.

Em relação à escola, segundo Gadotti e Romão (2004, p. 16):

(...) ela contribui para a democratização das relações de poder no seu interior e, consequentemente, para a melhoria da qualidade do ensino. Todos os segmentos da comunidade podem compreender melhor o funcionamento da escola, conhecer com mais profundidade todos os que nela estudam e trabalham, intensificar seu envolvimento com ela e, assim acompanhar melhor a educação ali oferecida.

Podem-se acrescentar, sem demérito aos autores, as decisões e acompanhamento, pelo colegiado, na aplicação dos recursos públicos destinados à escola. A comunidade tem que participar de todos os aspectos que envolvem a unidade de ensino. Ser chamada a participar das decisões sobre os aspectos pedagógicos e financeiros permite à comunidade escolar uma co-responsabilidade para com a escola pública.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB nº 9394/96 estabelece como princípio para a gestão democrática:

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;

Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.

Por estar presente em um conjunto de leis, a gestão democrática não é garantia de um exercício livre e autônomo de seus conselheiros, que precisam ser qualificados para entender a escola com possibilidades concretas de transformação da realidade social a qual está submetida. Ela é aquilo que o processo de interação de seus membros deseja.

Nesse sentido, Romão e Padilha (2004, p. 96) alertam:

A gestão democrática não é um processo simples de curtíssimo prazo, mas também não é um processo tão complexo ou irrealizável, de prazo interminável. Significa dizer que ela se constituirá numa ação, numa prática a ser construída na escola. Ela acontecerá se associada à elaboração do projeto político-pedagógico da escola. À implantação de Conselhos de Escola que efetivamente influenciem a gestão escolar como um todo e às medidas que garantam a autonomia administrativa, pedagógica e financeira da escola, sem eximir o Estado de suas obrigações com o ensino público.

A gestão democrática realmente não é um processo simples, pois a escola está estruturada de forma hierárquica, o que dificulta, mas não impede o processo democratizante nas escolas.

Paro (2005, p. 100) aponta para essas dificuldades, quando afirma que:

Na estrutura formal de nossa escola pública está quase totalmente ausente a previsão de relações humanas horizontais, de solidariedade e cooperação entre as pessoas, observando-se, em vez disso, a ocorrência de uma ordenação em que prevalecem relações hierárquicas de mando e submissão. O mais alto posto dessa hierarquia é ocupado pelo diretor, verdadeiro chefe da unidade escolar e responsável último por tudo o que acontece aí dentro. Esta condição lhe dá uma imensa autoridade diante das demais pessoas que interagem no interior da escola, mas quase nenhum poder de fato, já que a autoridade que ele exerce é concedida pelo Estado, a quem deve prestar conta das atividades pelas quais é responsável. Assim, independentemente de sua vontade, o diretor acaba assumindo o papel de preposto do Estado diante da instituição escolar e de seus usuários.

Autoridade e poder são, portanto, elos que a gestão democrática pode romper criando as bases para uma escola autônoma onde prevaleçam os interesses coletivos, sobre os interesses pessoais, conforme ensina Barroso (1996, p. 186), pois:

A autonomia da escola não é a autonomia dos professores, ou a autonomia dos pais, ou a autonomia dos gestores. A autonomia (...) é o resultado do equilíbrio de forças (...) entre os detentores de influência (externa e interna) (...). Deste modo, a autonomia, afirma-se como expressão da unidade social que é a escola e não preexiste à ação dos indivíduos. Ela é um conceito construído social e politicamente, pela interação dos diferentes atores [sujeitos] organizacionais em uma escola.

Isto significa que não existe (...) uma ’autonomia decretada’, contrariamente ao que está subjacente às mais diversas estratégias ’reformistas’ neste domínio. O que se pode decretar são normas e regras formais que regulam a partilha de poderes e a distribuição de competências entre os diferentes níveis de administração, incluindo o estabelecimento de ensino.

Autonomia, portanto, é a construção coletiva de uma dada comunidade, nesse caso, a escolar. Isso não significa independência da organização frente a sua mantenedora, mas uma relação de interdependência, conforme a distinção feita por Sarmento apud Moura (1999), que afirma que as organizações escolares podem assumir diversas formas de regulação, tendo em conta duas grandes linhas: o formal/informal, e a diacronia/sincronia (correspondendo à continuidade/mudança). Desta forma, o autor refere que, no cruzamento destas duas grandes linhas, as escolas podem assumir quatro formas de regulação. A primeira é a regulação normativa, correspondendo a um conjunto consignado de finalidade e intenções. A segunda é a regulação institucional, na qual a tradição institucional, por meio das mais variadas formas conduz a um alto grau de conformidade simbólica. A terceira é a regulação administrativa, que procura mobilizar os dispositivos e os recursos de ação para atingir determinados fins no contexto organizacional da escola. Finalmente a quarta forma é a regulação contigencial, distinguindo-se das outras, pelo fato de a regulação não se exercer sob a forma de normas, de comportamentos, de atitudes ou de atos administrativos, mas de se apresentar sobretudo como dependente do momento e da situação.

As regulações são diretrizes traçadas para que a organização escolar possa ter um ordenamento legal, conforme as disposições emanadas das leis. O grau de autonomia que a escola pode exercer não pode ferir as normas constitucionais. Ela parte da dinâmica da própria escola ao construir sua identidade. Isso é, os atores, na construção da identidade da escola, terão que apontar a escola que querem e se lançarem de forma autônoma, na elaboração do projeto que a edifique. A autonomia, portanto, se apresenta quando a comunidade escolar constrói os rumos de sua própria organização, sem interferir nos ordenamentos legais, cuja determinação os entes públicos têm que seguir. É na democracia plena que a escola construirá sua autonomia, pois os valores democráticos que permeiam a sociedade possibilitam à escola o desenvolvimento de um projeto pedagógico que a insere de forma autônoma na sociedade.

Descentralização de recursos públicos às escolas da rede estadual de ensino

Criação e desenvolvimento do Fundo Rotativo

O Fundo rotativo foi criado com a finalidade de suprir as escolas paranaenses com recursos financeiros para a manutenção, recuperação e conservação dos prédios públicos.

É oriundo de programas descentralizados de recursos, desenvolvidos pela FUNDEPAR ao longo dos últimos 30 anos. Solução criativa encontrada pelo Instituto, passando a ser um instrumento ágil, viabilizando com maior rapidez o repasse de recursos aos Estabelecimentos de Ensino da Rede Estadual, para a manutenção e outras despesas relacionadas com a atividade educacional (FUNDEPAR, on-line, 2006).

A descentralização ganha vulto a partir da promulgação da Constituição do Estado do Paraná, em 05 de outubro de 1989, que prevê em sua norma constitucional a descentralização de recursos para os órgãos dos poderes do Estado e seu controle interno.

A Constituição Estadual de 1989 estabeleceu:

Art.78. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:

(...)

II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração estadual, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;

Art. 133. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:

(...)

III - os orçamentos anuais.

§ 1° A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá de forma regionalizada as diretrizes, objetivos e metas da administração pública estadual direta e indireta, abrangendo os programas de manutenção e expansão das ações de governo.

(...)

§ 3° A lei de diretrizes orçamentárias, de caráter anual, compreenderá:

I - as metas e prioridades da administração pública estadual direta e indireta;

II - as projeções das receitas e despesas para o exercício financeiro subseqüente;

III - os critérios para a distribuição setorial e regional dos recursos para os órgãos dos poderes do Estado;

Art. 187. Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, objetivando atender a todas as necessidades exigidas pela universalização do ensino, sendo que, cumpridas tais exigências (...).

Rumo à autonomia de gestão dos recursos destinados às escolas estaduais, em 18 de julho de 1990, o Conselho de Administração da Fundação Educacional do Paraná baixa a Resolução nº 04/90, que dispõe sobre repasse de recursos financeiros, exclusivamente para atender as despesas com a manutenção das escolas da rede estadual, sob regime de adiantamento. Nela está presente toda a regulamentação da aplicação dos recursos e estabelece que a “análise, aprovação e regularização da Prestação de Contas ficarão sob responsabilidade do Tribunal de Contas” (art. 17) cabendo à Fundepar, através do Departamento Econômico Financeiro atuar como “coordenadora, promovendo orientação, treinamento e controle dos recursos repassados em regime de adiantamento, bem como a expedição de normas complementares” (art. 18). Estão presentes as normas para a liberação de recursos e o controle externo, pois a prestação de contas é enviada ao Tribunal de Contas do Estado, que deverá verificar os atos de legalidade do gestor e emitir o parecer aprovando ou reprovando as contas. No âmbito escolar ainda não está presente a comunidade escolar como fiscalizadora dos atos da administração escolar.

Aperfeiçoando o sistema de descentralização de recursos para atender as necessidades emergenciais das escolas paranaenses, de forma contínua e ininterrupta, o Governo do Estado resolve criar o fundo rotativo[1] através de lei, a qual autorizou o Poder Executivo a criar o Fundo Rotativo, administrado pelo diretor e fiscalizado pela comunidade escolar, conforme o teor da lei que expressa o seguinte: “Art. 1º. Fica autorizado o Poder Executivo a criar Fundo Rotativo em cada uma das Escolas Estaduais, administrados pelos respectivos diretores, fiscalizados pela comunidade escolar e regidos pela presente lei”.

Com a publicação da Lei nº 14.267[2], que “autoriza o Poder Executivo a criar Fundo Rotativo em Estabelecimentos de Ensino, Núcleos Regionais de Educação, nas Unidades Descentralizadas da Secretaria de Estado da Educação e nas Delegacias de Polícia”. Revogou-se a lei anterior, mas manteve grande parte do conteúdo da mesma, alterando alguns prazos e ampliando a descentralização para além das escolas estaduais do Paraná.

Nessa Lei, as Secretarias de Estado que foram contempladas com a criação do fundo rotativo serão responsáveis pela fiscalização da aplicação dos recursos financeiros, constituindo como um controle externo. No caso das escolas, além do controle exercido pela SEED, o ente interno também é responsável pela fiscalização dos respectivos recursos em cada unidade que compõe a rede de ensino, conforme podemos ler:

Art. 1º. Fica autorizado o Poder Executivo a criar o Fundo Rotativo em cada um dos Estabelecimentos de Ensino da Rede Pública Estadual, nos Núcleos Regionais de Educação, nas Unidades Descentralizadas da Secretaria de Estado da Educação e nas Delegacias de Polícia, administrados pelos respectivos dirigentes.

§ 1º. As respectivas Secretarias fiscalizarão a aplicação dos recursos de cada Fundo Rotativo.

§ 2º. Sem prejuízo do disposto no § 1º, a Comunidade Escolar fiscalizará a aplicação dos recursos dos Fundos dos Estabelecimentos de Ensino (grifo nosso) (Lei nº 14.267/03).

Estabeleceu ainda, a participação da comunidade escolar como fiscalizadora dos atos de gestão dos recursos públicos, isto é, criou um controle interno para apreciar a prestação de contas antes de serem enviadas à Fundepar. Para esse fim, determinou prazos, para a execução dos recursos financeiros e o encaminhamento das referidas contas[3], conforme segue:

Art. 4º. A administração do Fundo prestará contas da aplicação dos recursos de cada exercício ao Tribunal de Contas do Estado, na forma e prazos legais.

§ 1º. A prestação de contas dos Fundos Rotativos dos Estabelecimentos de Ensino deverá ser enviada até 31 de janeiro do ano subseqüente ao respectivo Núcleo Regional de Educação e posteriormente à Fundepar.

I – O Núcleo terá 30 dias para analisar a prestação de contas.

II – A Fundepar terá 90 dias para analisar a prestação de contas e enviar ao Tribunal de Contas.

§ 2º. A prestação de contas dos Fundos Rotativos dos Núcleos Regionais de Educação e das Unidades Administrativas Descentralizadas da Secretaria de Estado da Educação deverão ser enviadas até 31 de janeiro do ano subseqüente à Secretaria de Estado da Educação para análise, que as enviará, em até 120 dias, ao Tribunal de Contas do Estado (Lei n.º 14.267/03).

A referida lei disciplinou também a aplicação dos recursos descentralizados, sendo de caráter exclusivo para a manutenção e a conservação do prédio público, bem como para as atividades de seu dia-a-dia. As reformas serão objeto de verbas específicas, a critério da mantenedora, conforme podemos perceber:

Art. 2º. A receita de cada Fundo Rotativo será composta pelas transferências do orçamento do Estado e contribuições da comunidade, e destinada às despesas da respectiva unidade.

§ 1º. Os Estabelecimentos de Ensino, os Núcleos Regionais de Educação e as Unidades Administrativas Descentralizadas da Secretaria de Estado da Educação poderão aplicar os recursos:

I – na manutenção, reparos, aquisição de material de consumo e outros gastos correntes;

II – mediante prévia autorização, poderão realizar despesas relativas a reformas, melhorias, ampliações, aquisição de equipamentos e materiais permanentes e outras despesas de capital.

A aplicação dos recursos, portanto, segue o que determina a lei. Ao gestor do fundo rotativo cabe o que está escrito na legislação. Não há autonomia. O poder administrativo do diretor fica restrito a de mero “repositor” de materiais de consumo e de “reparador” do prédio público. Não há, portanto, poder para investir na aquisição de bens permanentes. Assim, as atividades pedagógicas, por vezes, ficam comprometidas. É uma lógica inadequada, que impõe à escola uma impotência frente aos desafios da modernidade. É preciso, portanto, dar autonomia para que os Conselhos Escolares possam decidir sobre o que comprar e como pagar, sem ter que esperar por bens permanentes por parte dos órgãos estatais, que por vezes, ficam subutilizados ou nem chegam a ser utilizados por não fazerem parte do projeto pedagógico das escolas.

Liberação dos recursos via Fundo Rotativo

Os recursos são liberados de acordo com o programa de descentralização estabelecido pela Fundepar que ocorrem mensalmente, a partir do mês de fevereiro, até o mês de novembro de cada ano. São dez (10) parcelas liberadas para o exercício no corrente ano, via cota normal do fundo rotativo. Via cota suplementar, os estabelecimentos podem buscar recursos junto à Fundepar para realizar reformas, ampliação e melhoria no estabelecimento. Esses recursos podem ser efetivados, desde que seja aprovado pelo órgão competente e sua despesa não possa ser executada com os valores recebidos com a cota normal. Esses recursos são para as emergências, mas têm um condicionante: só recebem o recurso complementar as escolas que não tiverem pendências com a Fundepar. Caso tenha, recebe o após a regularização das pendências.

Para a liberação dos recursos, a Fundepar, desde 1992, adotou alguns critérios necessários para que as escolas possam receber os recursos financeiros, em conta corrente específica, a ser gerida pelo diretor de cada unidade escolar. Os critérios adotados são:

Valor linear de R$ 200,00 por Estabelecimento de Ensino;

Escolas acima de 1000 alunos, deixam de receber o valor linear, exceto as Escolas que ofertam somente o Ensino Fundamental;

As Escolas que ofertam o Ensino Fundamental, recebem o valor linear, mais valor per capita aluno;

As Escolas que ofertam Ensino Fundamental e Médio, recebem o valor linear, mais valor per capita sobre o número de alunos do Ensino Fundamental e 2 (duas) vezes o valor per capita sobre o número de alunos do Ensino Médio;

As Escolas que funcionam em 4 (quatro) turnos, recebem o valor linear, mais 20% sobre o valor per capita;

As Escolas Associadas, recebem o valor linear, mais 20% sobre o valor per capita;

Os CEEBJA/NAES, recebem o valor linear, mais o valor per capita equivalente a 50% sobre o número de alunos matriculados (valor máximo liberado sobre 3.500 alunos) (FUNDEPAR on line 2006).

Percebe-se que a liberação de recursos leva em consideração o número de alunos e não o tamanho do prédio público, nem tampouco a área em que o prédio está edificado. É preciso buscar uma nova orientação para que a distribuição seja justa. Há escolas que, por sua horizontalização tenham a necessidade de maiores recursos, pois seus pátios não são totalmente edificados e necessitam de equipamentos e recursos humanos para sua limpeza, diferentemente daquelas que são verticalizadas e que possuem pátios cobertos por calçadas. Há escolas que possuem pátios não urbanizados, isto é, pátios com gramas, capins e outras plantas daninhas e sua manutenção não é realizada pelos servidores do Estado. É preciso, portanto, uma reestruturação no fator distributivo para tornar justo o Fundo Rotativo.

Destinação dos recursos via Fundo Rotativo

Na busca pelos princípios constitucionais que regem a administração pública, conforme estabelecido na Constituição do Estado que a disciplina:

Art. 27. A administração pública direta, indireta e fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, eficiência, motivação, economicidade...

O Estado do Paraná estabeleceu a Lei. 14.267/03, que criou o fundo rotativo, eliminando a burocracia que dificultava a gestão dos recursos nas escolas públicas do Paraná. Nesse sentido a lei possibilita uma maior autonomia, por parte dos gestores, na aplicação dos recursos, objetivando a eficiência, legalidade e economicidade na aquisição do que a escola necessita para sua manutenção e conservação. Portanto, livre da burocracia, os gestores podem adquirir materiais didáticos, esportivos, de limpeza, de expediente, gás, lâmpadas, entre outros e, podem executar serviços de pequenos reparos, tais como: troca de vidros, limpeza de caixa d’água, fechaduras, instalação elétrica e hidráulica, entre outros. Isso possibilita, no âmbito da administração escolar, maior agilidade e eficácia em suas ações, pois a dinâmica interna da escola, não pode ficar presa à burocracia que dificulta suas ações educacionais. A escola não pode esperar por soluções externas a ela. A eficiência na administração é resultado desse esforço promovido pelo poder executivo que estabeleceu a descentralização de recursos financeiros com objetivos específicos na sua manutenção, conforme pode-se ler:

I – na manutenção, reparos, aquisição de material de consumo e outros gastos correntes;

II – mediante prévia autorização, poderão realizar despesas relativas a reformas, melhorias, ampliações, aquisição de equipamentos e materiais permanentes e outras despesas de capital (art. 2° da Lei nº 14.267/03).

Recuperar a escola pública é um passo importante para o processo de inclusão escolar. O respeito ao espaço público exige do gestor do fundo rotativo, respostas rápidas na recuperação da estrutura física do estabelecimento por ele administrado, pois segundo Freire apud Gasparello (2000, p. 34:35):

(...) precisamos demonstrar que respeitamos as crianças, suas professoras, sua escola, seus pais, sua comunidade, que respeitamos a coisa pública, tratando-a com decência. Só assim podemos cobrar de todos o respeito também às carteiras escolares, às paredes da escola, às suas portas. Só assim podemos falar de princípios, de valores. O ético está muito ligado ao estético. Não podemos falar da boniteza do processo de conhecer se sua sala de aula está invadida de água, se o vento frio entra decidido e malvado sala a dentro e corta seus corpos pouco abrigados. Neste sentido é que reparar rapidamente as escolas é já mudar um pouco sua cara, não só do ponto de vista material, mas, sobretudo, de sua ‘alma’ (...) Reparar, com rapidez, as escolas é um ato político que precisa ser vivido com consciência e eficácia.

Nesse processo, a democratização da escola pública está intimamente relacionada à materialidade do espaço escolar. “O material e o imaterial, o aspecto quantitativo e o qualitativo, o espaço escolar e a sua ‘alma’, não são pólos distintos, separados, mas interligados e complementares. Respeitar a coisa pública é dar condições concretas e criar um ambiente bonito e interessante para que a comunidade escolar possa trabalhar, estudar, viver, amar e ser mais (GASPARELLO, s/d: 12).

Plano de Aplicação e prestação de contas

O Plano de Aplicação é o orçamento realizado para as atividades de manutenção, conservação e preservação do prédio público. A cada verba recebida pelas unidades de ensino, o Gestor do Fundo Rotativo, em conformidade com as normas regimentais, convoca o Conselho Escolar para a elaboração do respectivo plano de aplicação, que é um plano de metas para o estabelecimento de ensino.

Após a aprovação do respectivo plano de aplicação pelo Conselho Escolar, a direção está autorizada, como poder executivo, de executar as determinações contidas no plano. Assim, as despesas poderão ser realizadas pela direção do estabelecimento de ensino. Para esse fim, a Fundepar desenvolveu planilhas que auxiliam os diretores das escolas na prestação de contas. Nestas planilhas constam os modelos de formulários, de ofícios de encaminhamento da prestação de contas, de plano de aplicação, de demonstrativo de aplicação dos recursos e de relatórios de origem e aplicação dos recursos.

Cabe à comunidade escolar, portanto, participar da aprovação do plano de aplicação, do acompanhamento da execução das despesas, e dos relatórios e prestação de contas, conforme atribuições estabelecidas no Estatuto do Conselho Escolar.

Com o estabelecimento do Estatuto do Conselho Escolar e nos Regimentos da Escola, os conselhos escolares, de caráter deliberativo, devem aprovar o plano escolar e elaborar a política orçamentária da escola. Além disso, cada unidade pode gerenciar projetos “(...) pedagógicos próprios que com o apoio da administração possam acelerar a mudança da escola” (FREIRE apud GASPARELLO, 2000, p. 79).

Esse princípio segue para todas as Escolas Estaduais do Paraná, cujo compromisso de gestão democrática é parte da redemocratização do país. A eleição para diretor, por si só, não é suficiente para assegurar a gestão democrática, nem mesmo tendo a garantia expressa na lei. Ela é uma condição necessária, mas não suficiente. É preciso ter gestores escolares abertos ao diálogo com a sociedade, que sua representatividade não seja autoritária e saiba respeitar as diferenças e crenças políticas de cada indivíduo que se insere no mundo como sujeito de sua história e promotora de sua historicidade.

Demonstrativo de Aplicação de Recursos - DAR

A Lei de Responsabilidade Fiscal[4] - LRF trouxe inúmeras alterações no modo de administrar o Poder Público, pois estabeleceu normas de gestão dos recursos públicos voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. Destacam-se nessa lei, o planejamento, o controle, a transparência e a responsabilidade como premissas básicas de gestão. Criou novos procedimentos para o gestor demonstrar os atos pertinentes a sua administração. A cada quadrimestre, o gestor encaminha relatórios de gestão fiscal pertinentes à aplicação de recursos no período aos órgãos responsáveis pelo controle social dos recursos públicos.

Para Pires e Motta (2006, p. 39) esta:

Lei é estruturadora da gestão da coisa pública. Mais que um controle do orçamento e busca do equilíbrio fiscal, por obrigar o executivo (...) a administrar dentro de rígidos limites de dispêndio, é indutora de uma gestão criativa, empreendedora, e de uma nova cultura, marcada pela qualidade do serviço público e pelo respeito à cidadania. Institucionalizados os canais de participação, as pessoas poderão co-responsabilizar-se com o futuro de suas comunidades, realizando seus sonhos, e assumir de fato a “res publica”.

Cumprindo com essa determinação, a Fundepar, em parceira com a Companhia de Informática do Paraná – Celepar desenvolveu o programa Demonstrativo de Aplicação de Recursos – DAR, para que as escolas pudessem elaborar um Plano de Contas dos recursos mensalmente recebidos pela cota normal do fundo rotativo. Nos meses de maio, setembro e dezembro de cada ano, as escolas encaminham o DAR para o setor responsável pelo controle do Programa do Fundo Rotativo, junto aos Núcleos Regionais de Educação, ligados à Secretaria de Estado da Educação, para que possam ser remetidos ao Departamento de Acompanhamento e Avaliação da Fundepar, com os dados consolidados por cada unidade de ensino. Cumpre-se, assim com os preceitos estabelecido pela LRF, que é a emissão de relatórios de gestão fiscal por parte dos órgãos governamentais.

Considerações finais

A democratização no Brasil permitiu que a sociedade pudesse construir um novo modelo de gestão escolar. A luta dos educadores para democratizar as relações internas nas instituições escolares foi consagrada com a instituição de conselhos escolares, como forma de gestão escolar. Paralelamente à luta pela democracia escolar, outras lutas foram travadas pelos educadores, que podem destacar a autonomia didática para que cada escola pudesse desenvolver seus projetos políticos-pedagógicos de acordo com o perfil de sua comunidade. Nesse sentido, a comunidade saiu vitoriosa, posto que a construção da escola que se quer ver edificada fica a cargo da comunidade escolar, respeitando-se a legislação em vigor. Ao mesmo tempo, a autonomia financeira para que a escola possa no âmbito de suas discussões, prever onde e como aplicar os recursos oriundos da descentralização financeira conquistada.

De acordo com o porte de cada escola a Fundepar, via fundo rotativo, promove a descentralização de recursos para sua aplicação após deliberação do Conselho Escolar. Órgão representativo da comunidade no interior de cada escola, com estatuto próprio com seus fins e finalidades. Pode-se dizer que os recursos repassados por vezes são insuficientes, pois novas demandas foram produzidas em seu interior.

A consolidação da democracia nas escolas não foi acompanhada do processo de racionalização de seu controle interno. Percebe-se que os Conselhos Escolares, por vezes, são utilizados pelos gestores do fundo rotativo como meio para receber as parcelas que lhes cabem na descentralização dos recursos financeiros, pois sua gestão continua tendo um caráter pessoal. Isto é, o Conselho Escolar, na grande maioria das escolas, apenas referenda os atos da administração, pois não participa da elaboração do orçamento, preparando o plano de aplicação e nem acompanha sua gestão. É preciso, portanto, criar os mecanismos de controle interno, para que a gestão do dinheiro público se torne, de fato, pública e transparente.

Nesse sentido, podemos afirmar que um controle interno forte e presente nas estruturas dos poderes públicos e com servidores públicos bem preparados e compromissados com a democracia, da respaldo e resguarda a atuação dos gestores, pois pode impedir a ocorrência de irregularidades na aplicação do erário, o que resultará em uma melhor aplicação desses recursos para sua área de atuação, quer no governo federal, quer nos governos estaduais, quer nos governos municipais.

Portanto, para que a democratização nas relações internas da escola possa ocorrer de fato, se faz necessário, maior participação de pais e alunos na construção das diretrizes traçadas pela escola, tanto na gestão financeira, quanto pedagógica. Isto é, faz-se necessário a presença de pais, alunos e professores conscientes e cidadãos que, de fato, busquem no conflito as soluções para seus problemas construindo uma escola verdadeiramente livre e inclusiva, que respeite a todos, sem discriminação ou preconceito. A escola só vencerá as barreiras hipócritas daqueles que pensam que a escola é sua quando, efetivamente, em seu interior, todos puderem discutir de forma aberta, seus rumos, permitido que todos participem dessa edificação que é urgente e necessária. No entanto, um conjunto de leis não é sinônimo de democracia. É preciso mobilização da sociedade para tirar a escola da letargia em que se encontra, mas isso não é um processo fácil, pois a sociedade também se encontra em processo letárgico frente aos problemas enfrentados pela escola.


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Referências

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por VANDERLEI AMBONI

[1] O Fundo Rotativo foi criado pela Lei nº 10.050, de 16 de Julho de 1992, que foi publicado no Diário Oficial do Estado nº 3807 de 17/07/1992.

[2] Lei publicada em 23 de dezembro de 2003 no Diário Oficial nº 6.643, que revoga a Lei 10.050, mas mantém grande parte de seu teor e amplias as áreas de atuação e cria nova fiscalização.

[3] O Decreto nº 2043 de 12/01/93, emitido pelo Governo do Estado e publicado no Diário Oficial nº 3929 de 13/01/93, estabeleceu em seu art. 8º que “o prazo para aplicação dos recursos será até 15 de dezembro, devendo os saldos eventualmente existentes, nessa data, serem recolhidos à conta da Fundepar”.

[4] Lei Complementar n° 101, de 04 de maio de 2000, que confere aos gestores do dinheiro público responsabilidades na sua aplicação e formas de punições para quem não cumprir com suas determinações.

 
 

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Publicado em 21.04.07 - Última atualização: 20 agosto, 2007.