por ALAN RODRIGUES DE SOUZA

Graduado em História e Mestrando em Educação UEM

 

 

 

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Limites e dilemas das reformas educacionais e a perspectiva de Mészáros

Alan Rodrigues de Souza

 

Resumo:

Os fatos educacionais só podem ser convenientemente entendidos quando expostos conjuntamente com uma análise socioeconômica em que tem lugar. Pois a educação é, uma dimensão da vida que se transforma historicamente, acompanhando e articulando-se às transformações dos modos de produzir a existência humana. O artigo procura discutir os dilemas e as limitações das reformas educacionais frente à incapacidade de transposição das contradições inerentes à lógica alienante da sociedade do capital. Utilizando como parâmetro às perspectivas de István Mészáros, a proposta é focalizar as reformas educacionais de maneira global, não se atendo a pontos ou casos específicos.

Palavras-chave: Reforma Educacional, Alienação, Mészáros.

Abstract:

The education facts can only be understood conveniently when exposed jointly with a socioeconomic analysis in that she has room. Because the education is, a dimension of the life that changes historically, accompanying and pronouncing to the transformations of the manners of producing the human existence. The article tries to discuss the dilemmas and the limitations of the reforms education front to the transposition incapacity of the inherent contradictions to the alienating logic of the society of the capital. Using as parameter to István Mészáros perspectives, the proposal is to focus the education reforms in a global way, not trusting to points or specific cases.

Word-key: Reforms Education, Alienation, Mészáros.

 

István MészárosA educação como instrumento da transformação e de qualificação do trabalho, atingiu no século XX, uma extraordinária rapidez em sua universalidade sem parâmetros na história da humanidade. Entre Eras de catástrofe e de ouro, a educação passou a significar acima de tudo um fator de status superior concebido entre as camadas da sociedade. Além disso, cada vez tornou-se mais evidente a força com que são transmitidos valores, que fazem perpetuar as relações entre os grupos que compõem a sociedade contemporânea. Sob perspectiva histórica, serão abordadas aqui as contradições das reformas educacionais dentro da lógica alienante da sociedade do capital, tendo como parâmetro às análises de István Mészáros[1]. O objetivo não é discutir pontos específicos de qualquer tipo de reforma, ou analisar qualquer que seja em específico. Trata-se de uma discussão em perspectiva global que procura evidenciar através de uma análise marxista as tentativas de reformulação dos sistemas educacionais nas sociedades capitalistas.

Para o historiador Eric Hobsbawm as transformações no mundo da produção fizeram romper definitivamente com o mundo do passado e levaram a uma súbita morte do campesinato. A mecanização e o avanço da tecnologia foram responsáveis pelo êxodo rural, principalmente em países industrialmente desenvolvidos. Paralela a esta urbanização do mundo, Hobsbawm aponta que, em proporções ainda maiores e em conseqüência de tais transformações, houve o crescimento de ocupações que exigiam educação secundária e superior e conseqüentemente a demanda por estas.

Na verdade, as famílias corriam a pôr os filhos na educação superior sempre que tinham a opção e a oportunidade, porque esta era de longe a melhor chance de conquistar para eles uma renda melhor e, acima de tudo, um status social superior. dos estudantes latino-americanos entrevistados por pesquisadores americanos em meados da década de 1960 em vários países, entre 79% e 95% estavam convencidos de que o estudo os colocaria numa classe social superior dentro de dez anos. (HOBSBAWM, 1995, p. 291)

Esta perspectiva conferida à educação é refletida em escala global. O aumento da demanda por educação deveu-se em grande medida, ao enfraquecimento do antigo modelo de ascensão e a crescente oferta de trabalho criada pelo novo modelo econômico industrial. Grande parte das camadas médias acreditava que as hierarquias ocupacionais das empresas e/ou as “nobiliarquias” do Estado, eram as únicas formas, através da qual poderiam manter ou conseguir status. Assim, a procura de trabalho cresceu significativamente, o que caracterizava a oferta, mas não o emprego, pois entre ambos havia a exigência de qualificação. (Atualmente o discurso da falta de qualificação ainda é utilizado em grande medida pelos gestores para justificar o desemprego de pessoal de nível médio e superior). Grosso modo, a grande demanda por educação e a “precária” qualificação profissional, além dos aspectos técnicos, foram pautas de grande parte das reformas educacionais na segunda metade do século XX.

Falta de vagas nas instituições de ensino superior; exclusão das camadas populares à educação; estrutura física precária para educandos e educadores; desvalorização dos profissionais da educação; desvalorização do trabalho qualificado pelo nível de instrução... É possível ressaltar diversos tipos de problemas inerentes aos sistemas educacionais na contemporaneidade, principalmente nas zonas periféricas. (Naturalmente respeitando as especificidades de problemas de cada realidade econômica, social e cultural que assume cada nação) A grande maioria foi levada em consideração por reformas. No entanto, como dizia Marx: “a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”. As reformas que visavam solucionar ou ao menos amenizar tais problemas fracassaram e novamente os velhos problemas “oprimem como um pesadelo o cérebro dos vivos”.

O sistema educacional é apenas a “ponta do iceberg” dos problemas que envolvem a sociedade do capital. Embora haja especificidades da realidade política, social e econômica de cada nação, a lógica sócio-metabólica permanece a mesma. De forma que, a educação é profundamente integradora da totalidade das relações sociais e institucionais da sociedade na qual vivemos.

O sistema educacional formal da sociedade não pode funcionar tranqüilamente se não estiver de acordo com a estrutura educacional geral – isto é, com o sistema específico de “interiorização efetiva” - da sociedade. A crise das instituições educacionais é uma crise da totalidade dos processos dos quais a educação formal é apenas uma parte. A questão central da atual “contestação” das instituições educacionais não é simplesmente o “tamanho das classes”, a “inadequação das instalações de pesquisa” etc, mas a razão de ser da própria educação. Essa questão envolve inevitavelmente não só a totalidade dos processos educacionais, “desde a juventude até a velhice”, mas também a razão de ser dos instrumentos e instituições do intercâmbio humano em geral. (MÉSZÁROS, 1981, p. 272)

Mészáros aponta que as instituições educacionais são apenas uma parte do restante da totalidade que envolve a sociedade. De forma que os problemas que envolvem as instituições educacionais são reflexos de uma crise da totalidade dos processos sociais, ou seja, uma crise estrutural de todo sistema da “interiorização”[2] capitalista. “Essa “interiorização”, desnecessário dizer, não pode ocorrer sem o efeito combinado de várias formas de “falsa consciência”, que representam as relações sociais alienadas de produção de mercadorias como expressão direta, “natural”, dos objetivos e desejos do indivíduo.” (MÉSZÁROS, 1981, p. 270).

Nesta perspectiva, podemos entender que, as estruturas reificadas[3] e alienadas[4] que envolvem as relações sociais no mundo do capital, oferecem remédios meramente parciais para problemas globais. Como os problemas em jogo são amplos, surge uma contradição entre o caráter global dos fenômenos sociais criticados e a parcialidade. O gradualismo dos remédios que são os únicos compatíveis com a lógica sócio-metabólica do capital. Há nesta lógica, um princípio de abstração dos problemas que envolvem as instituições e relações sociais em geral. Nenhuma novidade nisso, tendo em vista o “espírito comercial” levar a quase perfeição a divisão social do trabalho.

O grande dilema que envolve as reformas educacionais é a constatação de que o gradualismo reformista intensifica as contradições inerentes às relações sociais e institucionais alienadas, ao invés de superá-las. Ao tentar amenizar um problema, surgem outros, decorrentes das soluções praticadas para amenizar o primeiro, e assim por diante. Dessa forma vão surgindo as reformas, uma após a outra na tentativa de reformar o que é irreformável.

Tendo isso em vista, não é de surpreender que as grandes utopias educacionais do passado – que originalmente visavam a contrabalançar a força do poder alienante e desumanizador do “espírito comercial” – fossem totalmente ineficazes contra a difusão da alienação e da reificação em todas as esferas da vida. Mesmo no campo da educação superior, que por muito tempo se pode proteger sob a fachada glorificada de sua própria irrelevância para as necessidades de um capitalismo de laissez-faire que se expandia “espontaneamente”, o ideal de criar um “indivíduo multilateral” e “harmonioso” foi gradualmente abandonado e a mais limitada especialização predominou em seu lugar, passando a produzir “conselheiros”, “peritos” e “especialistas” para a máquina do capitalismo moderno, que cresce como um câncer. (MÉSZAROS, 1981, p. 268-269)

Mészáros leva-nos a entender que, a transformação qualitativa e quantitativa da educação sob a perspectiva de humanização e socialização do conhecimento, tornar-se-á impossível sem a superação da lógica sócio-metabólica do capital. Os sistemas educacionais não estão abstraídos do restante do conjunto das totalidades que envolvem a sociedade, e sim compõem uma parte desta. A lógica predominante e global que rege as relações sociais de produção, não pode ser superada pela parte que compõe o conjunto das totalidades. De forma que se torna necessário romper com a lógica sócio-metabólica do capital, para que seja possível emancipar as partes do conjunto das totalidades alienadas no mundo das mercadorias.

O “espírito comercial”, para a sua plena realização, exige a fragmentação, a mecanização e a reificação de todas as relações humanas. É por isso que a sorte do ideal de “universalidade”, expresso nas grandes utopias educacionais do passado, foi selada na forma que todos sabemos. O que decidiu a sorte dessas utopias no momento mesmo de sua concepção foi o fato de pretenderem produzir seus efeitos no lugar das modificações sociais necessárias, e não através delas. (MÉSZÁROS, 1981, p. 269)

A educação é uma dimensão da vida, que se transforma historicamente acompanhando e articulando-se às transformações dos modos de produzir a existência humana. Logo, se faz parte da lógica da sociedade da qual vivemos a mecanização, fragmentação e a reificação. A fundamentação e organização dos sistemas educacionais seguirão o mesmo propósito. Segundo Mészáros, “a educação tem duas funções principais numa sociedade capitalista: (1) a produção das qualificações necessárias ao funcionamento da economia, e (2) a formação de quadros e a elaboração dos métodos para um controle político”. (MÉSZÁROS, 1981, p. 273) Qualquer alteração que provoque um descompasso entre estas duas funções principais, os sistemas educacionais tornam-se objeto de reforma. A reforma portanto, não visa a humanização e socialização do conhecimento, mas sim, a adequação às novas formas sociais de produção e reprodução da sociedade capitalista, que em determinado momento histórico entram em contradição.

A razão do fracasso de todos os esforços anteriores, e que se destinavam a instituir grandes mudanças na sociedade por meio de reformas educacionais lúcidas, reconciliadas com o ponto de vista do capital, consistia – e ainda consiste – no fato de as determinações fundamentais do sistema do capital serem irreformáveis. (...) Limitar uma mudança educacional radical às margens corretivas interesseiras do capital significa abandonar de uma só vez, conscientemente ou não, o objetivo de uma transformação social qualitativa. Do mesmo modo, contudo procurar margens de reforma sistêmica na própria estrutura do sistema do capital é uma contradição em termos. É por isso que é necessário romper com a lógica do capital se quisermos contemplar a criação de uma alternativa educacional significativamente diferente. (MÉSZÁROS, 2005, p. 26-27)

Para ilustrar os limites inerentes às reformas educacionais na sociedade do capital, utilizaremos dois exemplos: a demanda pela educação superior e as políticas de contenção empregadas nos Estados Unidos e no Brasil no início do terceiro quarto do século XX.

Wright Mills em A Nova Classe Média, mostrou as origens de uma política de contenção das demandas de educação escolar nos EUA. Mills segue a mesma linha de Hobsbawm ao demonstrar como se formou e se processou a busca pelos cargos de “colarinho branco”. Após a segunda guerra mundial, o tipo de cargo de “colarinho branco”, passa a ser a “menina dos olhos” das camadas médias da sociedade estadunidense. Este tipo de cargo em grandes empresas era impetrado pelo nível de escolaridade e capacitação dos pretendentes. No entanto, com o passar de algumas décadas o mercado de trabalho já não conseguia absorver a mão-de-obra especializada recém saída dos “fornos” das universidades. Gerando assim, desemprego e desvalorização da força de trabalho. Desta forma, é posta em prática algumas idéias que primavam o desencorajamento dos estudantes de nível médio a almejarem cargos do tipo “colarinho branco”.

Essas idéias são postas em prática de maneira geral, embora oficiosamente, nas escolas secundárias americanas o diretor de um ginásio declara: “esse sistema educacional é um terrível desperdício de dinheiro e de tempo para a cidade. (...) É surpreendente o número de alunos de 8C que aspiram prestígio de um emprego de colarinho-branco. Por isso, procuro mostrar-lhes que é difícil ajustar-se a tal tipo de emprego e progredir nele, a maioria dos alunos não é feita para esse tipo de trabalho. (MILLS, 1976, p. 288)

Problema sério para as camadas médias, mas nem tanto para as camas inferiores. Neste mesmo estudo, Mills aponta que, o nível de instrução dos filhos tem muito mais haver com as condições financeiras dos pais, do que propriamente com a inteligência de suas proles. E ao final, aponta as suas conclusões acerca do sistema educacional estadunidense. Embora a citação seja longa, vale a pena conferir.

Estamos, assim, muito longe da crença “na igualdade de instrução” como uma parte do modelo americano de sucesso. Primeiro, a instrução é uma via muito especializada que se reserva às elites com possibilidade de acesso à classe superior; para a maioria da população, o caminho da ascensão social não inclui a educação. Homens independentes, que se fazem sozinhos, competem num mercado aberto e alcançam os níveis correspondentes às suas capacidades.

Segundo, a educação democratiza-se em virtude das reivindicações políticas e necessidades econômicas, a estrutura ocupacional requer pessoas alfabetizadas e dotadas de algumas aptidões, e instala, portanto, um período em que o sucesso exige a instrução. O sistema único de ensino para todos não é objetado, pois a ideologia da igualdade de oportunidades significa que todas as posições elevadas são disputadas por todos aqueles que tem capacidade para galgar a escala educacional.

Terceiro, a instrução é necessária para quase toda a mobilidade ocupacional, mas como a oferta excede a demanda, a educação é submetida a uma estratificação burocrática, através da qual os jovens são selecionados por testes e outros tipos de medida. (...) Como a demanda de pessoas instruídas fica abaixo da oferta, como ocupações que exigem pessoal formado são fragmentadas e padronizadas, como o número de matrículas continua a aumentar, as diferenças de renda e prestígio entre os mais instruídos e os menos instruídos diminuem. (MILLS, 1976, p. 289)

As questões apontadas por Mills, configuram-se no tipo de sociedade baseada numa economia de mercado competitiva do tipo liberal. Nesta perspectiva, é “natural” que os sujeitos alcancem o sucesso almejado de acordo com suas capacidades que também são construídas ou obtidas “naturalmente”. Aqui entra a ideologia do “Dom”, muito bem desmistificada por Pierre Bourdieu em L’école conservatrice. Les inégalités devant l’école et la culture. Na segunda questão, Mills aponta que, a instrução só é desejável no momento de necessidade do mercado, ou seja, no momento em que estrutura econômica requer mão-de-obra especializada. Neste sentido, a educação não é bem vista como principio de universalização e socialização do conhecimento, mas apenas como instrumento de capacitação de “uns poucos” para o mercado. De forma que, para estes poucos, a igualdade de oportunidades seja exercida plenamente. Por último, os apontamentos de Mills se encaixam na velha conhecida Lei da oferta e da procura: quanto mais gente escolarizada no mercado, mais é desvalorizado este tipo de qualificação. De maneira que, a diferença entre a remuneração exercida aos “escolarizados” e aos “não escolarizados” tende a diminuir.

A questão da demanda por educação também foi pauta das discussões que ensejaram a Reforma Universitária de 1968 no Brasil. Entre os anos 50 e 60, a procura pela educação de nível médio e superior aumentou em grandes proporções.

A partir de 1964 intensificou-se o processo econômico de concentração de propriedade, capital, renda e mercado, devido à política econômica, adotada a partir daí. Houve então, grande quantidade de falências de pequenas empresas durante a recessão a partir do primeiro semestre desse ano. Com isso, ficavam mais dificultadas as possibilidades de ascensão da classe média via poupança, investimento e reprodução de capital através da instalação de pequenas empresas, artesanatos e de exercícios de profissão liberal. Em conseqüência, a demanda do ensino superior aumentou de modo que o crescimento das matrículas resultou insuficiente diante de uma procura cada vez maior. No período 1964 – 1968, o número de candidatos às escolas superiores cresceu de 120%, taxa superior à elevação do número de vagas que foi de 56%. (CUNHA, 1980, p. 238-239)

Com o crescente aumento de pessoas interessadas em instrução superior e a falta de vagas tanto na rede privada quanto na rede pública. Começa haver uma pressão social para que fosse ampliado o sistema de ensino superior no Brasil. No entanto, os tecnólogos em educação junto aos organismos governamentais, sabiam que dentro do modelo de desenvolvimento econômico, caracterizado pela sua dependência externa, não era possível ampliar a rede de ensino superior e conseqüentemente as vagas almejadas pelas camadas médias. Isso por que poderia comprometer o empenho do Estado na concentração de capital e ao atendimento de outros serviços públicos.

Em primeiro lugar, o atendimento das demandas de mais vagas implicava, necessariamente, um grande aumento de despesa pública. (...) A pressão no orçamento já era de tal modo intensa que esse crescimento das matrículas no ensino superior impedia que se melhorasse o atendimento no ensino primário e ginasial que permaneceu praticamente estagnado. (...) se esse crescimento de vagas nas escolas superiores se desse a um ritmo ainda maior, poderia haver um comprometimento do esforço do Estado na concentração de capital e/ou uma diminuição do desempenho de outros serviços públicos. (...) Em segundo lugar, o aumento da taxa de expansão de vagas nas escolas superiores resultaria, a curto prazo, no aumento do contingente de profissionais demandando emprego, problema considerado politicamente mais grave do que a “simples” demanda de vagas. (CUNHA, 1980, p. 239-240)

Diante de tal dilema, a solução encontrada pelo Governo foi criar políticas de profissionalização do ensino médio. Com isto, as necessidades menos apuradas de qualificação eram atendidas, tirando um pouco do “peso das costas da universidade” em fornecer mão-de-obra especializada. “Essa preocupação estava presente no Relatório do Grupo de Trabalho da Reforma Universitária de 1968, que recomendava, como solução do problema, a longo prazo, a profissionalização do ensino médio.” (CUNHA, 1980, p. 245)

Nos dois casos expostos, as soluções encontradas não resolveram os problemas da marginalização e exclusão geradas pelos sistemas educacionais. O que houve foi apenas a tentativa de “tapar o sol com a peneira”. Enquanto a lógica do sistema for a produção de mercadorias, ao invés de ser a satisfação de necessidades humanas, a educação irá continuar a ser apenas objeto das necessidades nefastas do capital.

Para concluir, é necessário ressaltar que a questão da demanda educacional tratada aqui como exemplo foi apenas meramente ilustrativa, existem diversos outros tipos de problemas que cercam os sistemas educacionais e que as reformas apenas amenizam-nos, não sendo o remédio necessário para o diagnóstico. O que foi pretendido mostrar, é que qualquer reforma educacional empregada no mundo capitalista, tende a satisfazer as lógicas sócio-metabólicas do capital, não podendo ser diferente. Os sistemas educacionais não estão deslocados da estrutura econômica, política e jurídica da sociedade. Os objetivos e fins da educação são originados por determinadas formas de consciência que se articulam com as transformações dos modos de produzir a existência humana. Já dizia Marx: “a totalidade destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta uma superestrutura jurídica e política, e a qual correspondem formas sociais determinadas de consciência.” (MARX, 1978, p. 130) Imaginar que a educação possa ser reformada seguindo esta lógica, na perspectiva de torna-la mais humana e universal é perder de vista a compreensão sobre o funcionamento e a lógica do capital. Como dizia José Martí: “Las redenciones han venido siendo formales, es necesario que sean esenciales”.

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[1] István Mészáros nasceu em Budapeste em 1930. Filho de pais muito pobres, trabalhou como operário e só no pós-guerra, com o regime de “democracia popular” , teve possibilidade de aprofundar seus estudos. Cursou a Universidade e se diplomou em filosofia. Ainda na primeira metade de 1950, tornou-se assistente do Professor George Lukács na Universidade de Budapeste. Renomado entre os pensadores marxistas, escreveu diversas obras e tem publicado diversos ensaios em revistas.

[2] Segundo Mészáros, a “interiorização” é um processo pelo qual os indivíduos adotam as perspectivas gerais da sociedade de mercadorias como os limites inquestionáveis de suas próprias aspirações, contribuindo desta forma para a manutenção de uma concepção de mundo e de uma forma específica de intercâmbio social.

[3] A Reificação é o ato (ou resultado do ato) de transformação das propriedades, relações e ações humanas em propriedades, relações e ações de coisas produzidas pelo homem, que se tornaram independentes (e que são imaginadas como originalmente independentes) do homem e governam sua vida. Significa igualmente a transformação dos seres humanos em seres semelhantes a coisas, que não se comportam de forma humana, mas de acordo com as leis do mundo das coisas. A Reificação é um caso “especial” de Alienação, sua forma mais radical e generalizada, característica da moderna sociedade capitalista.

[4] Grosso modo, Alienação no sentido marxista seria a ação pela qual um indivíduo, um grupo, uma instituição ou uma sociedade se tornam, ou permanecem, alheios, estranhos, enfim, alienados aos resultados ou produtos de sua própria atividade.

Referencias

BOURDIEU, Pierre. L’école conservatrice: les inégalités devant l’école et la culture. In: Revue Française de Sociologie. Paris, n. 7, 1966. p. 325-347.

CUNHA, Luiz Antônio. Educação e Desenvolvimento Social no Brasil. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1980.

HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

MARX, Karl. Os Pensadores. São Paulo: Paz e Terra, 1974.

MÉSZÁROS, István. A Educação para Além do Capital. São Paulo: Boitempo, 2005.

___________. Marx: a teoria da alienação. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981.

MILLS, Wright. A Nova Classe Média. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976.

 

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Publicado em 20.04.07 - Última atualização: 23 abril, 2007.