Estudo
      sobre a fidelidade à palavra empenhada: a constituição moral de crianças
      e adolescentes da rede pública e privada de ensino fundamental na cidade
      de Cáceres MT
      
      
       
      
      
      Josiane
      Magalhães
      
 
      
      
      
        
        
          
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               Resumo:
              
              
               
              Pretende-se
              apresentar em linhas gerais o embasamento teórico que dá suporte
              ao projeto sob o mesmo título, desenvolvido junto a Universidade
              do Estado de Mato Grosso. Apresenta a metodologia empregada para o
              desenvolvimento da pesquisa com estudantes de ensino fundamental e
              alguns dados parciais coletados em campo e que delineiam alguns
              indicativos de como se desenvolve a moralidade na região da
              cidade de Cáceres/MT.
              
               
              Palavras-chave:
              Piaget, juízo moral, fidelidade à palavra empenhada.
              
               
              Abstract:
              
              
               
              This
              study intends to present in general lines the theoretical
              embasement that supports the project under the same title
              developed next to the University of the State of Mato Grosso. It
              also shows the methods used to the research development with basic
              grade students and some data base obtained in field work that
              points to the way morality is built in the city of Cáceres/MT and
              its arrounding. 
              
               
              Key-words:
              Piaget, moral judgment, fidelity to the pawned word.
              
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Introdução
      
      
      Este
      estudo tem sido desenvolvido a partir de contatos formalizados em termos
      de compromisso com a direção das escolas envolvidas.
      A equipe comprometeu-se em não divulgar nomes ou respostas que pudessem
      identificar o informante, tentando garantir que os mesmos não se
      sentissem pressionados a dar “respostas prontas” ou “esperadas”
      por professores ou dirigentes. No ano de 2004 e início de 2005 realizamos
      entrevistas com alunos, todos concordando em ser voluntários para a
      pesquisa,
      oriundos do ensino fundamental em uma escola pública e outra privada na
      cidade de Cáceres – MT. Constituiu-se um banco de dados com 93 (noventa
      e três) entrevistas transcritas e tabuladas através do SPSS. A partir
      das transcrições foi possível construir as categorias de análise
      segundo a técnica de L Bardin (s/d) que nos auxiliou na análise das
      respostas obtidas nas entrevistas sob a luz da teoria piagetiana. 
      
      
      A
      formação do juízo moral segundo Piaget
      A
      obra de Jean Piaget (1994) está permeada por uma preocupação com a
      compreensão do desenvolvimento humano como um todo. Apesar da relevância
      dada ao desenvolvimento cognitivo, há em Piaget um potencial maior,
      explicitado em sua obra “O juízo moral na criança”. Isto porque nela
      evidenciam-se propostas para o desenvolvimento de uma compreensão acerca
      da formação do indivíduo no que tange aos seus princípios de deveres e
      direitos na elaboração de um sistema social.A importância da obra
      piagetiana é indiscutível e sua metodologia tem sido base de inúmeras
      pesquisas na área da psicologia social e no desenvolvimento cognitivo
      infantil. É óbvio que busca na infância a fonte de observação e
      construção de seu modelo, uma vez que o ser humano ao atingir sua idade
      adulta, passou por processos importantes e vivenciou experiências
      fundamentais que se desenvolveram durante o período de crescimento que
      vai do nascimento até a idade adulta. Os processos de socialização que
      moldam o indivíduo e seu comportamento social foram então a base de
      reflexão para o desenvolvimento das conclusões expostas em “O juízo
      moral na criança”. Tendo em vista que este livro serve de base para a
      elaboração de toda a metodologia em que irá se basear o presente
      estudo, tentaremos a seguir explicitar os principais conceitos e como
      foram elaborados. Além disso, a pertinência deste modelo de compreensão,
      que observa as relações sociais infantis e as têm como parâmetros para
      a análise da construção das regras sociais, está principalmente na
      construção dos conceitos de autonomia e heteronomia, os quais serão
      explicitados na discussão metodológica. Aqui nos deteremos a alguns
      pressupostos do modelo explicativo desenvolvido por Piaget(1994).
      
      
      O
      autor tem em mente que a organização social se dá através de regras
      sociais. Para obter uma certa isenção em relação à interferência
      adulta na formação das regras em sua essência, como formas de mediação
      nas relações entre indivíduos, busca uma instituição infantil que lhe
      permita observar, a partir de um exemplo específico, a dinâmica da formação
      das regras.
      
      
      O
      jogo de bolinhas foi o exemplo utilizado como um sistema muito complexo de
      regras que permitia, sobretudo, a observação de um sistema de relações
      puramente infantil que permanecia isento da interferência adulta. As
      regras regem o comportamento dos jogadores durante o jogo, sendo que são
      elaboradas e negociadas pelas próprias crianças. É, portanto, uma
      instituição social que serve de base para a compreensão de como se dá
      a construção das regras.
      
      
      Tem
      como pressuposto que “toda moral consiste num sistema de regras, e a essência
      de toda moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire
      por essas regras” (PIAGET,1994:23)
      
      
      Além
      disso, não se tratava apenas de estudar a moral infantil em si, mas,
      através dela, pensar a moralidade humana que, por sua vez, é entendida
      como o conjunto de regras seguidas pelos seres humanos que norteiam as
      relações que se estabelecem entre eles.
      
      
      Um
      outro pressuposto é que a teoria “é uma espécie de projeção
      abstrata da moral praticada numa sociedade dada, a uma época dada”
      (PIAGET,1994,:11)
      Isto remete à consideração dos indivíduos historicamente datados e
      situados geográfica e culturalmente. Sendo assim, em cada organização
      social há uma especificidade na construção da moralidade, isto é, os
      indivíduos aprendem maneiras diferentes de observação e construção
      das regras.
      
      
      Vale
      ressaltar também que o ser humano possui um lado irracional e outro
      racional. É neste último que o juízo moral atua, com os critérios de
      avaliação, com os objetivos conscientes de conduta etc, que nem sempre
      movem nossas ações. No entanto, são elementos de uma racionalidade que
      se torna condição sine qua non de equilíbrio social e pessoal,
      fortalecendo também o “ego”. O lado racional é imprescindível para
      o desenvolvimento da organização e complexidade social. E, exatamente
      por conta disso, se tornou o objeto de estudo a que Piaget (1994) se
      dedicou.
      
      
      Um
      outro aspecto importante para a elaboração do modelo piagetiano é o
      emprego do par assimilação/ acomodação, como suporte para suas reflexões.
      
      
      
      Para
      Piaget, o conhecimento se dá através da assimilação das informações
      do meio, que é determinada por estruturas mentais. Tais estruturas, por
      sua vez, modificam-se pelo contato com os objetos (físicos e sociais) do
      meio. Às vezes, o processo de assimilação predomina: é o caso do jogo
      simbólico quando a criança transforma os objetos do mundo para que
      satisfaçam seus desejos (por exemplo, transformar uma vassoura em
      “cavalo”). Outras vezes, a predominância é da acomodação, como no
      caso da imitação: a criança se transforma para tomar o aspecto do
      objeto imitado.  (PIAGET,1994:18)
      
      
      Em
      um momento, a criança procura assimilar um objeto através dos esquemas
      que já conhece. Todavia, se esse objeto possui características
      diferentes, resiste em parte à assimilação possível através dos
      esquemas já construídos. Assim, ocorre um processo de acomodação, pois
      os esquemas modificam-se e enriquecem-se para dar conta das características
      do novo objeto. Quando essa acomodação esgota-se, Piaget fala em equilíbrio
      entre a assimilação e a acomodação.
      
      
      No
      caso da evolução moral da criança, Ives de La Taille (1994), em seu
      texto introdutório para a edição em português do “Juízo Moral na
      Criança”, nos chama a atenção para o seguinte: 
      
      
      (...)
      as primeiras formas de interpretação (assimilação) que a criança faz
      da moral adulta são decorrências das estruturas mentais que possui.
      Estas ainda não lhe permitem uma apropriação intelectual racional do
      porquê das regras: portanto, a criança acredita serem boas porque são
      impostas por seres vistos como poderosos e amorosos (os pais). Mas, por
      que “milagre” se desenvolverão estruturas mentais capazes de uma
      apreciação racional das “verdades” emitidas pelos adultos? Ora, por
      um novo tipo de integração social - a cooperação - para a qual as
      antigas estruturas serão insuficientes. Este novo tipo de interação,
      promovido em grande parte pelas relações das crianças entre si, vai
      exigir um trabalho de acomodação, portanto, de modificação das
      estruturas anteriores. Se esta acomodação não for exigida, a criança
      permanecerá acreditando no caráter absoluto das regras morais e na sua
      legitimidade proveniente da autoridade de quem as impôs.”
      (LA
      TAILLE apud PIAGET, 1994:18)
      
      
      Importância
      deve ser dada também ao conceito de egocentrismo em Piaget, onde temos
      que
      
      
      (...)
      é no momento em que o sujeito está mais centrado em si que ele menos se
      conhece; e é na medida em que descobre a si mesmo que o sujeito se situa
      num universo e constitui este em razão desta descoberta. Em outros
      termos, egocentrismo significa ao mesmo tempo ausência de consciência de
      si e ausência de objetividade, enquanto a tomada de consciência do
      objeto é inseparável da tomada de consciência de si.”
      (PIAGET,1994:18).
      
      
      Sob
      este aspecto podemos afirmar que o indivíduo se define em relação ao
      outro. Isto nos faz pensar que em uma fase onde o outro não é algo
      relevante na vida da criança (fase do egocentrismo), a definição de si
      mesmo não se processa.
      
      
      Assim
      sendo, podemos dizer que a vida de um indivíduo e suas experiências, o
      leva ao desenvolvimento de um maior ou menor grau de participação. Se
      ele faz parte de relações sociais onde a cooperação aparece raramente,
      então permanecerá a vida toda em uma moral heterônima, “procurando
      inspirar suas ações em “verdades reveladas” por deuses variados ou
      por “doutores” considerados à priori como competentes e “acima de
      qualquer suspeita”.”(PIAGET,1994:19)
      
      
      Sublinhe-se
      ainda uma tese essencial à teoria de Piaget:
      
      
      “a
      ação precede a consciência; esta é uma “tomada de consciência” da
      organização efetiva daquela. Assim, no nível da inteligência, as operações
      mentais serão uma abstração do funcionamento efetivo das ações sensório-motoras.
      No nível moral, as concepções de Bem e de Mal serão abstrações das
      relações sociais efetivamente vividas” (Idem, ibidem.).
      
      
      Logo,
      a prática precede a teoria, o que dá suporte ao método proposto de
      levantamento de dados, já que a proposta baseou-se em julgamentos acerca
      de situações cotidianas fictícias.
      
      
      Segundo
      Piaget (1994), “toda moral consiste num sistema de regras, e a essência
      de toda moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire
      por essas regras” (PIAGET,1994:23) Como então, a criança vem a
      respeitar as regras? A resposta encontrada por Piaget é a seguinte:
      
      
      Em
      primeiro lugar, temos que “as regras morais, que a criança aprende a
      respeitar lhe são transmitidas pela maioria dos adultos, isto é, ela as
      recebe já elaboradas e, quase sempre, nunca elaboradas na medida de suas
      necessidades e de seu interesse, mas de uma só vez e pela sucessão
      ininterrupta das gerações adultas anteriores. Daí, a extrema
      dificuldade de uma análise que deveria distinguir o que provém do conteúdo
      das regras e o que provém do respeito da criança aos seus próprios
      pais” (Idem,
      ibidem.)
      
      
      Em
      virtude desta dificuldade, Piaget procurou uma instituição em que as
      regras fossem elaboradas pelas crianças e transmitidas de geração a
      geração, mantendo-se graças ao respeito que os indivíduos têm por
      elas. Essa instituição puramente infantil se encontrava em brincadeiras
      infantis: o jogo de bolinhas.
      
      
      No
      jogo, as relações sociais se dão entre indivíduos iguais.
      
      
      Os
      menores que começam a jogar, aos poucos, são dirigidos pelos maiores no
      respeito à lei e, além disso, inclinam-se de boa vontade para essa
      virtude, eminentemente característica da dignidade humana, que consiste
      em observar corretamente as normas do jogo. Quanto aos maiores, fica a seu
      critério a modificação das regras.”
      (idem,ibidem.). 
      
      
      Fica
      claro que a criança é influenciada pelos pais, pois desde a mais tenra
      idade é submetida a múltiplas disciplinas e, antes de falar, toma consciência
      de certas obrigações. Isto irá influenciá-la na elaboração das
      regras do jogo. No entanto, o autor nos chama a atenção para o fato de
      que a intervenção adulta reduz-se ao mínimo quando se trata de instituições
      lúdicas, pois estamos diante de realidades elementares onde a
      espontaneidade irá nos conduzir a um campo fértil de ensinamentos.
      A fim de responder a pergunta inicial, como a criança vem a respeitar as
      regras, foram analisados dois grupos do fenômeno:
      
      
      1º)
      A prática das regras, isto é, a maneira pela qual as crianças de
      diferentes idades as aplicam efetivamente.
      
      
      2º)
      A consciência da regra, isto é, a maneira pela qual as crianças de
      diferentes idades representam as regras: sejam elas consideradas de caráter
      obrigatório, sagrado ou decisório, segundo a heteronomia ou a autonomia
      inerentes às regras do jogo.” (PIAGET,1994:24)
      
      
      E
      acrescenta ainda:
      As
      regras do jogo de bolinhas representam uma realidade social bem
      caracterizada, ou seja, “independente dos indivíduos”,
      transmitindo-se de geração a geração como um idioma. (...) As inovações
      individuais somente tem sucesso, tal como as inovações lingüísticas,
      se atendem a uma necessidade geral e se são sancionadas pela
      coletividade.”(Idem.ibidem:30-31)
      
      
      
      A
      partir disso, a pergunta que foi proposta consiste em:
      1º)
      como os indivíduos se adaptam pouco a pouco a essas regras, como então
      observam a regra em função de sua idade e de seu desenvolvimento mental.
      
      
      2º)
      Que consciência tomam da regra ou, em outras palavras, que tipos de
      obrigação resultam para eles, sempre de acordo com as idades, do domínio
      progressivo da regra. (Idem.ibidem)
      
      
      Após
      um interrogatório realizado com o intuito de rastrear respostas às
      perguntas acima, Piaget (1994) obteve que em relação à prática das
      regras, podemos identificar quatro estágios sucessivos:
      
      
      Um
      primeiro estágio, puramente motor e individual, no decorrer do qual a
      criança manipula as bolinhas em função de seus próprios desejos e de
      seus hábitos motores. Estabelece, nessa ocasião, esquemas mais ou menos
      ritualizados, mas, permanecendo o jogo individual, ainda não se pode
      falar senão de regras motoras e não de regras propriamente coletivas”
      (PIAGET, 1968:33).
      Vale
      lembrar que nessa fase, a criança, muito embora esteja sujeita a
      regularidades, como o suceder do dia após a noite, os horários de
      alimentação, etc, não há uma seqüência em relação ao jogo, nem
      tampouco direção na sucessão de comportamentos.
      
      
      Há
      uma utilização de um esquema motor ligado à percepção das bolinhas,
      mas apenas ritualizado. Forma-se também o simbolismo que se insere
      imediatamente nos esquemas motores da criança. (as bolinhas tornam-se
      alimentos para cozinhar, por exemplo)
      
      
      Estes
      dois elementos, a ritualização e o simbolismo, aparentemente são condições
      para o próximo estágio. Isto porque “é possível que as regras do
      jogo derivem tanto dos rituais análogos àqueles que acabamos de
      observar, como de um simbolismo que se tornou coletivo” (PIAGET,
      1994:36). Geneticamente falando, os rituais e os símbolos parecem
      explicar-se pelas condições da inteligência motora pré-verbal. Um bebê
      colocado em presença de um objeto qualquer reage acomodando-se ao novo
      objeto e assimilando-o aos esquemas motores anteriores. 
      
      
      Essa
      assimilação de qualquer objeto novo aos esquemas motores já existentes
      pode ser tomada como ponto de partida dos rituais e dos símbolos, pelo
      menos desde o momento em que a assimilação supera a própria acomodação
      (...) todos os esquemas motores da criança dão origem, excluindo-se os
      momentos de adaptação propriamente dita, a uma espécie de funcionamento
      em vão que dá prazer à criança como se fosse um jogo.
      (PIAGET, 1994:37). 
      
      
      Acrescente-se
      que “quando à inteligência motora se juntam a linguagem e a representação,
      o símbolo torna-se objeto de pensamento”. (Idem, ibidem) Mas é com o
      caráter da obediência, da entrada do elemento da obrigação, que emana
      a regra na relação em sociedade ou simplesmente entre dois indivíduos.
      
      
      Um
      segundo estágio pode ser chamado egocêntrico, pelas razões que vamos
      expor. Esse estágio se inicia no momento em que a criança recebe do
      exterior o exemplo e regras codificadas, isto é, segundo os casos entre
      dois e cinco anos. Todavia, mesmo imitando esses exemplos, a criança
      joga, seja sozinha, sem se preocupar em encontrar parceiros, seja com os
      outros, mas sem procurar vencê-los e nem, por conseqüência, uniformizar
      as diferentes maneiras de jogar. Em outros termos, as crianças desse estágio,
      mesmo quando juntas, jogam ainda cada uma para si (todas podem ganhar ao
      mesmo tempo) e sem cuidar da codificação das regras. É esse duplo caráter
      da imitação dos outros e de utilização individual dos exemplos
      recebidos que designaremos pelo nome de egocentrismo.(PIAGET,1994:33)
      
      
      Esse
      estágio contém uma conduta intermediária entre as condutas socializadas
      e as puramente individuais. O problema nesse período é que:
      
      
      (...)
      a própria natureza da relação entre a criança e o adulto coloca a
      criança numa situação à parte, de tal forma que seu pensamento
      permanece isolado e, mesmo acreditando partilhar do ponto de vista de
      todos, ela fica, de fato, fechada em seu próprio ponto de vista. O próprio
      vínculo social ao qual a criança está presa, e por mais estreito que
      ele pareça quando visto do interior, implica, assim, um egocentrismo
      intelectual inconsciente, favorecido, além disso, pelo egocentrismo
      espontâneo característico de toda consciência primitiva.(PIAGET,1994:40)
      
      
      A
      par disso, temos que:
      
      
      (...)
      de um lado, a criança é dominada por um conjunto de regras e exemplos
      que lhe é imposto de fora. Mas, por outro lado, não podendo ainda se
      situar num pé de igualdade, frente aos mais velhos, utiliza para si e sem
      mesmo se dar conta de seu isolamento, o que conseguiu aprender da
      realidade social ambiente.(Idem,ibidem)
      
      
      
      Nesse
      estágio, o prazer é essencialmente motor, no que tange ao jogo de
      bolinhas, está na habilidade de acertar a bolinha, não sendo, portanto,
      um prazer social.
      
      
      O
      verdadeiro socius do jogador desse estágio não é o parceiro em carne e
      osso, mas o mais velho, ideal e abstrato, que ele se esforça
      interiormente por imitar, e que reúne o conjunto de exemplos recebidos até
      esse dia. Conseqüentemente, pouco importam os pormenores das regras, pois
      não há contato real entre os jogadores. É por isso que, desde que saiba
      imitar, esquematicamente, o jogo dos grandes, o menino desse estágio está
      convencido de conhecer a verdade integral: cada um para si, e todos em
      comunhão com o mais velho; essa poderia ser a fórmula do jogo egocêntrico.
      (Idem,ibidem)
      
      
      Um
      terceiro estágio aparece por volta dos sete ou oito anos. A este estágio
      Piaget chamou estágio de cooperação nascente. Nele, “cada jogador
      procura, doravante, vencer seus vizinhos donde o aparecimento da
      necessidade de controle mútuo e da unificação das regras”.
      (PIAGET,1994:33) Na medida em que a criança passa a lutar com seus
      parceiros, procurando vencer, se esforça, antes de mais nada, para
      observar as regras comuns.
      
      
      O
      divertimento específico do jogo deixa assim de ser muscular e egocêntrico
      para tornar-se social. Daí em diante, uma partida de bolinhas será
      formada por atos equivalentes àquilo que constitui uma discussão: uma
      avaliação recíproca das faculdades existentes que chega, graças à
      observância das regras comuns, a uma conclusão reconhecida por todos” (PIAGET,1994:44)
      
      
      O
      quarto estágio é o da codificação das regras. As partidas são
      reguladas com minúcia, bem como os pormenores do procedimento e é
      estabelecido um código de regras a serem seguidas. Assim, temos que a
      diferença entre o terceiro e o quarto estágios está no grau de
      normatização.
      
      
      No
      tocante à consciência das regras, Piaget identificou uma progressão
      mais suave no pormenor, mas não menos nítida em suas linhas gerais.
      “Durante o primeiro estágio, a regra é puramente motora e talvez
      suportada, como que inconscientemente, a título de exemplo interessante e
      não de realidade obrigatória” (PIAGET,1994:34)
      
      
      Segundo
      o autor, ela se estende do nascimento até o início do estágio egocêntrico.
      
      
      O
      segundo estágio se inicia no decorrer da fase egocêntrica, terminando
      mais ou menos na metade do estágio de cooperação, por volta dos nove a
      dez anos. Nele “a regra é considerada como sagrada e intangível, de
      origem adulta e de essência eterna; toda modificação proposta é
      considerada pela criança como uma transgressão.” (PIAGET,1994:34) 
      
      
      O
      terceiro estágio de consciência das regras abrange o fim do estágio de
      cooperação da prática das regras até o estágio de codificação das
      regras. “A regra é considerada como uma lei imposta pelo consentimento
      mútuo, cujo respeito é obrigatório, se deseja ser leal, permitindo-se,
      todavia, transformá-la à vontade, desde que haja o consenso geral”.
      (PIAGET,1994:34)
      
      
      Podemos
      demonstrar essa sobreposição de estágios assim:
      
      
      
       
      Vale
      ressaltar que a correlação indicada entre os estágios do
      desenvolvimento da consciência da regra e os estágios relativos à sua
      prática efetiva é apenas estatística, quantitativa, mas em linhas
      gerais há uma relação.
      
      
      A
      regra coletiva é, inicialmente algo exterior ao indivíduo e, por conseqüência,
      sagrada. Depois, pouco a pouco, vai-se interiorizando e aparece, nessa
      mesma forma, como livre resultado do consentimento mútuo e da consciência
      autônoma. Ora, no tocante à prática, é natural que ao respeito místico
      pelas leis, correspondam um conhecimento e uma aplicação ainda
      rudimentar de seu conteúdo, enquanto, ao respeito racional e motivado,
      corresponde uma observância efetiva e pormenorizada de cada regra.
      Haveria assim, dois tipos de respeito à regra, correspondendo a dois
      tipos de comportamento social. (PIAGET,1994:34-5)
      
      
      Nos
      dois primeiros estágios da prática das regras, a criança seguiria o que
      Piaget chamou de formas de heteronomia. Na heteronomia, a criança
      considera as regras como obrigatórias, intangíveis e devendo ser
      consideradas literalmente. “Essa atitude resulta da coação exercida
      pelos mais velhos sobre os menores e da pressão devida aos próprios
      adultos, sendo, dessa forma, as regras do jogo assimiladas a deveres
      propriamente ditos” (PIAGET,1994:92) Nessa forma heterônima a regra está
      fora do sujeito, sendo que, como não há interiorização subjetiva, fora
      do contexto social estabelecido há a necessidade de um certo grau de coerção
      social, sendo que neste caso a regra é levada ao pé da letra.
      
      
      Já
      nos estágios seguintes, temos as formas de autonomia. Neles, a criança
      tem um comportamento em relação às regras como o consenso advindo da
      socialização com as outras crianças, levando em conta além de si
      mesma, a situação das outras crianças afetadas pelas regras, que servem
      de intermediárias entre elas.
      
      
      Há,
      nesse sentido, um ambiente propício para o desenvolvimento de esferas de
      participação de todos os indivíduos que estão sob a égide das regras
      definidas para a intermediação das relações sociais que ali se
      desenvolverem.
      
      
      As
      organizações humanas estão permeadas de estruturas que se situam em um
      continuum de dois pólos: de um lado a heteronomia e, do outro, a
      autonomia. Lembrando que a heteronomia caracteriza-se segundo os
      pressupostos piagetianos como critérios de julgamento onde as regras ou
      normas são obrigatórias, intangíveis e devem ser consideradas
      literalmente. Sendo assim, a regra está fora do sujeito, não havendo
      interiorização, sendo objeto de coerção social.
      
      
      Em
      contraponto à heteronomia, há a autonomia. Nela, os atores levam em
      consideração a influência de suas ações sobre outras pessoas que serão
      afetadas por seus atos. 
      
      
      As
      normas morais não dizem respeito às ações intencionais em geral, mas
      àquelas ações intencionais pelas quais queremos exercer influência em
      outras pessoas. Assim, a formação adquirida pelos indivíduos ao longo
      de sua existência, propõe a aquisição de um sentimento de dever em
      relação às ordens que recebem de pessoas respeitáveis, sem fazer
      maiores indagações sobre o sentido destas ordens. Este estágio, Piaget
      chamava de “moral do dever”.
      
      
      Em
      relação a esse respeito “unilateral”, Piaget distinguiu o
      “respeito recíproco”, que consiste na capacidade de se colocar
      racionalmente no ponto de vista de outras pessoas. Na perspectiva
      piagetiana, as normas morais são regras racionais de acordo mútuo, sendo
      assim o respeito recíproco um pressuposto essencial para o entendimento.
      Uma norma é boa quando satisfaz as “leis de reciprocidade” e para
      reconhecer se uma norma é boa, o indivíduo terá de colocar-se numa
      perspectiva que se harmonize com outras perspectivas.
      
      
      A
      capacidade para a troca de perspectivas sociais é adquirida aos sete ou
      oito anos aproximadamente, na mesma idade em que o indivíduo também
      aprende a coordenar duas relações lógicas ou duas variações
      interdependentes, como se tornar mais comprido e mais delgado de uma bola
      de barro.
      
      
      A
      pesquisa:
      
      
      O
      projeto vem levantando dados desde março de 2004 junto às escolas públicas
      e privadas da cidade de Cáceres/MT. Os objetivos específicos colocam-se
      no sentido de: