O
trabalho enquanto dimensão contraditória da potencialidade humana na
trajetória de reestruturação produtiva
Resumo
Esse
artigo objetiva analisar num primeiro momento a temática
“trabalho”, que traz consigo uma contradição: o trabalho
sendo simultaneamente fator de construção do homem e sendo também
fator de negação da potencialidade humana. Nesse sentido, o
ponto de partida será a análise sobre a positividade do
trabalho, prosseguindo com a alienação do trabalhador frente aos
processos de trabalho, e em seguida tratando da caracterização
do trabalho e do trabalhador no contexto da reestruturação
produtiva. Por fim há um breve estabelecimento das mudanças no
mundo do trabalho.
Palavras-chave:
mundo do trabalho, reestruturação produtiva, alienação.
Abstract
Work
as a contradictory dimension of human potentiality in its course
of productive restructures.
This
article aims to analyze, first of all, the topic “work”, which
carries with itself a contradiction: work is simultaneously a
factor of human construction as well as a factor of denial of
human potentiality. In this sense, the start point will be the
analysis of work positiveness, moving on to workers alienation due
to work processes and then it tries to characterize work and
worker in the context of productive restructure. Finally, there is
a brief establishment of the changes in the work world.
Key-Words:
work world, productive restructure, alienation.
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O
trabalho enquanto contradição
Ao
analisarmos a temática trabalho, deparamo-nos com um paradoxo, uma
contradição: ao mesmo tempo em que o trabalho constrói o homem, ele
também o destrói. Dessa maneira, primeiramente iremos analisar de que
modo o trabalho é um fator positivo para a estruturação dos homens e
dos grupos sociais e de que modo o trabalho é um fator de negação da
potencialidade humana.
O
trabalho e sua dimensão positiva
Iniciemos
então com a positividade do trabalho, que se encontra em seu sentido
ontológico. O trabalho é a forma fundante do ser social, forma primeira
ou protoforma da atividade humana, da práxis (ANTUNES, 2002). Nesse
sentido, o trabalho se torna humano através da atividade de intercâmbio
entre o homem e a natureza, no qual ele a transforma de acordo com as suas
necessidades e simultaneamente ele também se transforma.
O
trabalho é também uma atividade essencialmente humana, devido ao fato de
que ele é dotado de teleologia: é um projeto que é previamente
planejado de modo intencional pela mente do homem, como ser da práxis,
visando uma determinada finalidade. Esse é o fator que diferencia o
trabalho humano do trabalho de todos os outros animais: ele é
intencional.
Enquanto
o homem adapta a natureza em função da satisfação das suas
necessidades, o animal adapta-se à natureza, desfrutando das condições
que ela lhe oferece. Se pensarmos no pássaro João-de-barro, ou na
abelha, ou na aranha, etc, eles sempre constroem suas moradias do mesmo
modo, através de seu trabalho, que nunca se complexifica e que é
resultado da objetividade de um instinto. Já os homens executam construções
que a cada dia que passa vão sendo cada vez mais complexificadas, na
medida em que o homem vai aperfeiçoando-as em suas projeções mentais.
Ou seja, a construção realizada por um homem é resultado da
objetividade de sua subjetividade e também é influenciada pelas relações
sociais às quais ele é constantemente submetido. Assim, através do
trabalho, os homens vão produzindo historicamente a sua existência e
suas relações sociais. Essa é a positividade do trabalho humano
criativo.
Portanto,
a positividade do trabalho o revela como uma atividade que funda o homem
como ser social, que é calcada no princípio da criatividade. Nesse
sentido, podemos perceber sua dimensão qualitativa, que se distingue pela
habilidade que é própria e inerente a toda e qualquer produção de bens
socialmente úteis, realizada pelo homem.
A
dimensão do trabalho como fator de negação da potencialidade humana
Prosseguiremos
então com o trabalho como fator de negação da potencialidade humana. Na
nossa sociedade capitalista, os homens produzem historicamente sua existência
através do trabalho (MARX, 2002). Para que isso aconteça, através do
trabalho que eles executam e também de acordo com sua história, eles são
divididos socialmente entre duas classes que apresentam interesses antagônicos.
Uma
classe é a dos proprietários dos meios de produção, ou seja, dos
capitalistas, e a outra é a dos possuidores apenas de sua força de
trabalho, que são os proletários. A relação entre ambas expressa uma
notável relação de desigualdade social e econômica. Como exemplos
dessa afirmação, temos dois fenômenos: o primeiro é que o trabalhador
proletário trabalha sobre o controle do capitalista e o segundo é que o
produto produzido diretamente pelo proletário não é propriedade dele,
mas sim dos capitalistas (ANTUNES, 2002).
Por
conseguinte, o resultado final do trabalho não pertence ao trabalhador; o
trabalho então tem caráter exterior ao do trabalhador. Essa é então,
uma manifestação de alienação. Para o trabalhador proletário, o
trabalho é algo penoso, que o remete ao sacrifício.
Assim,
as condições que regem o capitalismo e determinam o processo de trabalho
causam a alienação do trabalhador. Conseqüentemente o proletário não
consegue se reconhecer enquanto sujeito do produto do seu trabalho, pois
ele não decide nem mesmo sobre o que, como, para que e para quem
produzir.
Nas
relações de produção a alienação acontece de vários modos e o
estranhamento é a forma específica de alienação no sistema
capitalista. O trabalhador produz algo estranho, que não é seu, que ele
não pode possuir, que ele não consegue se ver como produtor direto desse
determinado algo e produz para alguém estranho (que geralmente é o
detentor dos meios de produção), que na maioria das vezes ele nem
conhece (ANTUNES, 2002).
Assim
esse trabalhador proletário, que vive do seu trabalho e para o seu
trabalho, é transformado pelas relações sociais e pelas relações de
produção em mera mercadoria. Ele é cada vez mais explorado e sempre
desvinculado do produto de seu trabalho quando está produzindo para o
“outro”.
Há
então, um processo de humanização da coisa e coisificação do homem,
criando o fetichismo da mercadoria e a conseqüente desumanização dos
indivíduos envolvidos em tal processo. A coisa, ou seja, o produto,
adquire uma certa ‘humanização’, uma vida própria. Já os
trabalhadores que produziram a coisa, são cada vez mais desumanizados em
detrimento do que produziram. Sua subjetividade e importância enquanto
ser humano são descartadas. Apenas o que interessa para os detentores dos
meios de produção, é a força de trabalho dos trabalhadores. E para os
trabalhadores, alienados pelo processo de trabalho no qual eles estão
inseridos, somente interessa a mínima quantia que eles recebem para
prover o sustento deles e de suas respectivas famílias.
Portanto,
a dimensão negativa do trabalho o revela como fator de coisificação da
potencialidade humana no capitalismo, como atividade que foi transformada
em labor, sacrifício, objetificação, devido à sobreposição de sua
dimensão quantitativa em relação à qualitativa. Ambas dimensões se
distinguem apenas pelo “quantum” socialmente materializado na
mercadoria, que é o que prevalece no capitalismo. Todo esse contexto traz
como conseqüências o fato do trabalhador não se reconhecer enquanto
sujeito do produto de seu trabalho, que acaba por negar sua dimensão de
ser social e também pelo fato de seu trabalho pertencer a outrem e não a
ele mesmo (ANTUNES, 2002).
A
reestruturação produtiva e o mundo do trabalho
Podemos
perceber que o capitalismo se nutre fundamentalmente da exploração dos
trabalhadores. Em momentos de crise, os capitalistas tentam recuperar os
lucros perdidos às custas de explorar mais ainda os trabalhadores, o que
agrava ainda mais a situação. Então, o sistema capitalista é atingido
em todo o seu conjunto pela crise econômica e conseqüentemente acaba
criando as condições objetivas de sua ruína. Os modelos de organização
da produção surgem como alternativas às crises econômicas do
capitalismo. Com o passar do tempo, esses modelos vão se tornando
insuficientes e incapazes de conter as contradições inerentes ao
sistema.
Nessa
perspectiva, daremos continuidade à discussão através da análise dos
modelos de organização da produção que surgem como alternativas às
crises econômicas do capitalismo.
Conseqüentemente,
a partir do momento em que um determinado modelo vai entrando em decadência,
outro modelo surge como resposta à crise, acarretando transformações no
processo produtivo. O próprio modelo denominado ‘fordismo’, surge como alternativa a uma das crises do capitalismo e
acaba se tornando um modelo
padrão de organização do trabalho e um modo de regulação das relações
na economia.
O
fordismo foi criado em 1913, por Henry Ford, e trouxe consigo inovações
tecnológicas, novas formas diferenciadas de gestão e novos princípios
de organização da produção (GOUNET, 2002).
Essa
modificação na produção realizada por Ford ocorre porque ele tinha em
mente fabricar um veículo de preço relativamente baixo (que para isso
deveria ser produzido de modo padronizado), de forma que fosse comprado em
massa. A idéia surgiu em função do antigo regime de trabalho, que
produzia os carros lentamente, devido ao fato deles serem compostos por múltiplas
peças e por isso como produtos finais, custavam muito caro (GOUNET,
2002).
Ford
modifica todo o processo de produção, aplicando em sua fábrica os métodos
elaborados por Friedrich Taylor, que em seu conjunto são denominados ‘taylorismo’,
que diz respeito à organização científica do trabalho (GOUNET, 2002) .
O
‘taylorismo’ é essencialmente uma técnica social de dominação,
elaborada por Friedrich Taylor, tendo como principal característica a
individualização dos salários. Seja através do salário por peça
produzida, seja através de prêmios adicionais, forma explícita de
introduzir a competição entre os trabalhadores, objetivando o aumento da
produtividade do trabalho evitando qualquer perda de tempo na produção.
Com fundamentação em o que move o mundo é o dinheiro, se a pessoa não
recebe ele não produz, a remuneração é um incentivo, assim os
incentivos seriam sempre financeiros.
As
determinações das tarefas não deveriam ficar a cargo dos operários,
mas deveriam ser estudadas, classificadas e sistematizadas por cientistas
do trabalho, no caso a gerência. Como idéia do planejamento para ter uma
cientificidade, ciência no sentido positivista, com determinados
conceitos de base empírica. O operário deve apenas realizar as instruções,
submeter-se às ordens impostas pela hierarquia da fábrica. Segundo os
princípios do ‘taylorismo’ cada tarefa e cada movimento de cada
trabalhador possuem uma ciência, um saber fazer profissional.
Assim
havia métodos como: método de racionalizar a produção, logo, de
possibilitar o aumento da produtividade do trabalho “economizando
tempo”, assegurando definitivamente o controle do tempo do trabalhador
pela classe dominante.
A
alienação do trabalhador tenta se apresentar como um dos subprodutos da
"administração científica". Ao se alienar, ele perde o
sentido da totalidade em relação ao processo produtivo, e por
conseguinte, do produto. O trabalhador individualmente está fragmentado,
sendo executor de uma tarefa simples e rotineira. A mecanização da produção
reduziu o trabalho a um ciclo de movimentos repetitivos.
Assenta-se
nos princípios do ‘taylorismo’, como
a produção em massa e em série, consolidação do operário-massa, onde
o trabalho de um depende do outro, padronização do processo de trabalho
e também do produto. Dessa perspectiva, o modelo assume outra racionalização:
o parcelamento das tarefas e conseqüentemente o parcelamento do saber.
Com isso, o operário executa apenas uma função específica e não
conhece mais a execução de todas as operações do processo de produção.
Além disso também foi
racionalizado o tempo, através da introdução do cronômetro, para
regular o tempo de trabalho e os movimentos dos trabalhadores. Assim a
produção torna-se padronizada, rotinizada e hierarquizada (divisão
social do trabalho), acarretando a desqualificação dos operários na
execução de seus respectivos trabalhos.
Enfim,
modelo de organização da produção
‘taylorista’ reduziu o homem a gestos e movimentos, sem capacidade de
desenvolver atividades mentais, que depois de uma aprendizagem rápida,
funcionava como uma máquina. O homem, de acordo com esse modelo de
organização da produção, podia ser programado, sem possibilidades de
alterações, em função da experiência, das condicionantes ambientais,
técnicas e organizacionais. A redução do trabalho mental também é
enfatizada na medida em que a superespecialização da tarefa levou a
simplificação do trabalho a um nível elevado, desprovendo o indivíduo
de sua capacidade pensante.
A
natureza genérica do ‘fordismo’, é também uma marca característica
da divisão do trabalho e a aplicação dos métodos ‘tayloristas’ e
da atribuição de funções parcelares dotadas de conteúdo praticamente
nulo a trabalhadores de uma maneira permanente, rotineira e monótona.
Nesse sentido, enquanto Ford se ateve a inovações e incrementações
tecnológicas da produção, Taylor se ateve às inovações e incrementações
no âmbito da gestão da produção, visando mudanças na relação do
gestor com o trabalhador (SILVA, 2001).
O
primeiro passo de Ford visando a produção em massa, foi de racionalizar
ao máximo as operações efetuadas pelos operários para combater desperdícios,
fundamentando-se nos princípios ‘tayloristas’ e da esteira rolante,
que possibilitava a ligação dos trabalhos individuais sucessivos,
gerando uma produção fluida (GOUNET, 2002).
A
eficiência do ‘fordismo’ exige escassas doses de qualificação dos
trabalhadores e de envolvimento dos mesmos com o sucesso da produção e
da empresa; exige-se dos trabalhadores que cumpram as tarefas de conteúdo
prescritas pelos gestores da produção.
Conseqüentemente
o ritmo do trabalho foi intensificado com a diminuição do tempo morto da
jornada de trabalho. Ao falarmos sobre essa caracterização do ‘fordismo’,
a teoria é ilustrada pelas imagens do clássico filme “Tempos
modernos”, o qual trata de forma bastante cômica (embora não deixe de
ser trágica), todas essas implementações na organização da produção,
que as fábricas começam a assumir, buscando a eficácia e a rigidez.
A
princípio, para obter mão-de-obra suficiente para a produção em massa,
Ford atrai trabalhadores para sua fábrica através de um significativo
aumento de salário. Mas somente receberia esse salário o operário que
comprovasse ter boa conduta, distante de certas vicissitudes como beber e
fumar. Com essa tática ele consegue atrair mão-de-obra para a fábrica,
mas não paga esse salário para muitos operários, alegando que não
deram boas provas de uma conduta disciplinada (GOUNET, 2002). Dessa
maneira, Ford estava concretizando os fundamentos básicos desse modelo:
aumento da produtividade, dos salários reais dos trabalhadores e do
consumo de massa.
À
luz do filme “Tempos modernos” conseguimos compreender melhor a dinâmica
dos modelos ‘fordista’ e ‘taylorista’, quando nele são expressas
cenas de intensificação do ritmo de trabalho, racionalização do tempo,
hierarquização, fragmentação do processo de trabalho, que geram o
trabalho como fator de negação da potencialidade humana e conseqüentemente
causa manifestações de alienação no sentido de alheamento e desumanização
dos trabalhadores.
Já
no filme “A classe operária vai ao paraíso”, tornam-se claramente
explícitas as manifestações de alienação dentro de uma fábrica e a
precarização do trabalho que nela ocorre de forma generalizada; a exigência
do perfil de um operário padrão que cumpre cotas; um ritmo de trabalho
enlouquecido; a influência negativa
do trabalho na subjetividade dos operários, que afeta até mesmo
suas relações íntimas e interpessoais; a impregnação do tempo de
trabalho ao tempo livre do trabalhador;
e como ponto positivo, a tentativa constante e persistente de lutar
pelo estabelecimento de uma forte unidade sindical, mas que não consegue
ser objetivada.
Visando
obter maior intensidade no processo de trabalho, o ‘fordismo’ retoma e
desenvolve o ‘taylorismo’, por meio de esteiras nos diversos segmentos
do processo de trabalho, assegurando o deslocamento das matérias primas
em transformação; e pela fixação dos trabalhadores em seus postos de
trabalho. Deste modo, é garantida que a cadência de trabalho passe a ser
regulada de maneira mecânica e externa ao trabalhador. Podemos,
portanto, caracterizar o ‘fordismo’ como produção em massa rígida
alicerçada no trabalho vivo (VIEIRA, 2001).
Crises
econômicas são características do sistema capitalista, diante de sua
crescente incapacidade de não conseguir conter por si só suas contradições.
Então, surgem como resposta, transformações no processo produtivo através
de um modelo de acumulação flexível, um novo modelo de organização da
produção denominado ‘toyotismo’.
Chama-se
‘toyotismo’, porque ele foi desenvolvido e implantado na fábrica da
Toyota, situada no Japão. Esse modelo tem dupla origem. A primeira foi
diante da necessidade de implantar o ‘fordismo’ no Japão, no intuito
de beneficiar a produção e promover uma progressiva lucratividade. Mas
Ohno, presidente da Toyota, não admitiu essa idéia. Desse modo, ele propôs
observar as experiências norte-americanas em relação ao ‘fordismo’,
não para copiá-las e sim para através delas, utilizar a pesquisa e a
criatividade para elaborar um modelo que se adaptasse à situação do Japão,
que era de produzir pequenas quantidades de vários modelos de produtos. E
a segunda, foi que as empresas do Japão sofriam o constante risco de
desaparecer, perante a competitividade com as empresas norte-americanas,
se nenhuma atitude fosse tomada para superá-las. (GOUNET).
Assim,
o ‘toyotismo’ é: “Um sistema de organização da produção baseado
em uma resposta imediata às variações da demanda e que exige, portanto,
uma organização flexível do trabalho (inclusive dos trabalhadores)”
(idem, p. 29).
As
principais características do ‘toyotismo’ em relação à produção,
é que ela é flexível, devendo ser determinada pelo consumo e pronta
para suprir a demanda do mesmo, apresentando também diversidade de
produtos. Além disso, a organização do processo de trabalho ‘toyotista’,
diferentemente da verticalização ‘fordista’, é marcado pela
horizontalização, sendo cada vez mais intensificado. Os trabalhadores são
progressivamente flexibilizados em relação às horas extras. Conseqüentemente
o trabalho temporário e
subcontratação predominam nas relações trabalhistas. Em suma, podemos
perceber que o que determina a produção nesse modelo de organização de
produção, é o consumo.
A
produção é organizada através do método kanban, baseado num sistema
de cartazes colocados em caixas que orientam as encomendas conforme a
demanda, que geralmente era utilizado nos supermercados, nos quais os
produtos somente são repostos quando eles são vendidos (GOUNET, 2002).
O
trabalho é constantemente flexibilizado e é intensificado ao máximo; é
contratado um mínimo de operários, que executam o máximo de horas
extras; o sindicato é totalmente vinculado ao patrão; a contratação de
trabalhadores é reduzida (agora os operários ou são subcontratados ou são
temporários, dependendo das condições e das demandas do mercado); há a
implantação da terceirização, que provoca a segmentação dos
trabalhadores, a precarização do trabalho e o enfraquecimento dos
sindicatos, em que direitos trabalhistas são flexibilizados ou até mesmo
eliminados.
Ora,
é o ‘toyotismo’ que irá propiciar, com um maior poder ideológico,
no campo organizacional, os apelos à administração participativa,
destacando-se o sindicalismo de participação e os CCQ’s;
reconstituindo, para isso, a linha de montagem e instaurando uma nova
forma de gestão da força de trabalho. Deste modo, uma característica
central do ‘toyotismo’ é a vigência da "manipulação" do
consentimento operário, objetivada em um conjunto de inovações
organizacionais, institucionais (e relacionais) no complexo de produção
de mercadorias, que permitem "superar" os limites postos pelo
‘taylorismo’/ ‘fordismo’.
As mudanças
trazidas pela adoção de princípios como autonomia e liberdade para o
trabalhador a fim de aumentar a produtividade, representariam a mais fina
essência do ‘toyotismo’. Entretanto, algumas características desses
novos modelos contrapunham-se ao estilo clássico da linha de montagem
enquanto esquema produtivo. O rompimento com os antigos padrões de gestão
da força de trabalho representaria o rompimento com o passado, com a
burocracia e com a hierarquia e caberia aos gestores construir uma nova
empresa, caracterizada pela interação, comunicação, solidariedade,
cooperação, integração e pela flexibilidade. A grande tentativa é de
fazer o indivíduo se identificar com a organização e seus objetivos.
Dentro
do ‘toyotismo’, é o próprio indivíduo que deve encontrar seus
limites, seu papel, seu espaço dentro da organização. O controle
organizacional ganha novos contornos, e as permissões e proibições
tornam-se internalizadas pelo trabalhador. Com a diminuição da supervisão,
da vigilância constante, é ele que vai se auto-regular.
Além
da incorporação do autocontrole não há um supervisor imediato de quem
se possa reclamar ou escapar, assim a resistência do indivíduo pode se
dar através da manifestação de doenças do trabalho, como os distúrbios
mentais e stresse.
Juntamente
com a internalização do controle, há a cobrança, por parte dos
dirigentes empresariais, do envolvimento com a implantação de mudanças
e do desenvolvimento da adaptabilidade e de uma certa integração em relação
à empresa.
Num
paradoxo, o discurso empresarial fala com freqüência no trabalho em
equipe, mas o gerenciamento torna-se cada vez mais individual e
individualista. O processo de individualização do coletivo de
trabalhadores enfraquece a noção de classe operária, na qual um é o
vigia do outro, não mais o colega, o companheiro.
Novas
políticas de recursos humanos são implantadas nas organizações,
podendo constituir riscos mentais significativos. Se por um lado a carga física
de trabalho reduz-se com a ampliação da automação, a carga psíquica,
pode elevar-se, levando os trabalhadores a um estado de tensão e
conflitos internos constantes. Dentro desse novo modelo de organização,
busca-se construir um novo trabalhador e uma nova gestão da força de
trabalho.
Para
a Gerência da Qualidade Total, o produto de melhor qualidade é aquele
que atende às necessidades do cliente. Assim o propósito da empresa seja
assumido por todos sem precisar fazer chamadas, não pode trabalhar só
com metas quantitativas e sim buscar a qualidade total constante, e que
este propósito da empresa seja assumido por todos sem precisar fazer
chamadas.
A
empresa deve atender as necessidades e desejos do cliente, para isso deve
melhorar de forma contínua seus processos, de modo a favorecer a
qualidade e produtividade para atender aos seus clientes.
O
clima organizacional da empresa é enfatizado, deixando claro que todos os
funcionários devem participar dos desafios que a empresa enfrenta,
destruindo as barreiras entre os departamentos, deve-se trabalhar em
equipe, pois a transformação da empresa é competência de todos. Sendo
assim a empresa deve estar bem-estruturada e harmônica para produzir com
qualidade.
Na
verdade, o aspecto original do ‘toyotismo’ é articular a continuidade
da racionalização do trabalho, intrínseca ao ‘taylorismo’ e ‘fordismo’,
com as novas necessidades da acumulação capitalista (ANTUNES, 2001).
Todos
os modelos de organização da produção referem-se ao planejamento e
organização do processo de trabalho de forma que possibilite o aumento
de produção e diminuição dos custos, gerando assim maior
produtividade, o que significa ampliar o excedente (mais-valia). Ou seja,
eles buscam uma organização racional do trabalho em dados objetivos,
mensuráveis, por isso, trabalham com controle estatístico do processo de
trabalho, organização metódica com base nesse controle. Buscam diminuir
o excedente e com isso que o lucro aumente.
Esses
modelos têm, portanto, um eixo comum, ressaltado por esses processos aqui
enfatizados. Todos eles afirmam ser generalizados, universais e aplicáveis
em qualquer processo de trabalho; todos eles trabalham com a idéia da
padronização da produção.
As
mudanças no mundo do trabalho
Todas
as medidas trazidas pelos modelos de organização da produção inerentes
ao sistema capitalista afetaram fortemente a classe trabalhadora e o seu
movimento sindical e operário. Paralelamente esse contexto traz consigo
um processo de mudanças em nossa sociedade, que nos leva a pensar sobre
as mudanças no mundo do trabalho.
É
na década de 1980 que ocorrem profundas transformações no mundo do
trabalho. Segundo Antunes (2002), foi nela a classe-que-vive-do-trabalho
sofre a mais aguda crise desse século, que atingiu tanto a sua
materialidade, quanto a sua subjetividade.
As
mudanças que ocorrem no mundo do trabalho não nos fazem perceber a
continuidade que há entre o ‘fordismo’/’taylorismo’ e o ‘toyotismo’.
Antes de tudo, devemos perceber que ambos são padrões de acumulação e
que contribuem para as mudanças no mundo do trabalho.
Também
na década de 1980, começam a ocorrer hibridizações desses e de outros
modelos de gestão e de organização da produção (ANTUNES, 2002).
Com
a flexibilização do trabalho e dos trabalhadores e de todas as suas
características que lhes são inerentes, os direitos do trabalho são
desregulamentados, desqualificados, desorganizados e precarizados. As
formas contratualizadas da força de trabalho são também precarizadas: o
vínculo empregatício formal vem sofrendo uma ofensiva cada vez maior
(ANTUNES, 2002).
Conseqüentemente,
há o enfraquecimento dos sindicatos, devido a sua perda de
representatividade com a diminuição do número de trabalhadores formais.
E os trabalhadores precarizados muitas das vezes nem têm representação
sindical. Há então a crise contemporânea do sindicalismo: crescente
individualização de trabalho, resignação social, fortíssima corrente
que desregulamenta e flexibiliza o limitado mercado de trabalho, os
sindicatos deixam de ser combativos para serem defensivos (há uma
institucionalização sindical), etc (ANTUNES, 2002).
E
uma das mais graves conseqüências que todo esse contexto acarreta é a
desumanização dos múltiplos sujeitos que são os trabalhadores
assalariados. A submissão dos mesmos a um trabalho imposto, assalariado,
sacrificado, estranho e irreconhecível a eles acaba produzindo a alienação.
Na
maioria das vezes, através do trabalho alienado esses sujeitos conseguem
apenas prover insuficientemente suas necessidades básicas. Afinal esse
trabalhador está trabalhando para outro, não sendo dono de sua própria
atividade. Por isso, o trabalho torna-se para ele uma força estranha, no
sentido que ele vai satisfazer e
beneficiar outro indivíduo e não ele mesmo.
Podemos
perceber, que a tendência atual é que o trabalho seja caracterizando
como uma dimensão negativa do homem e de sua potencialidade. Dessa
maneira, os trabalhadores contemporâneos acabam sendo submetidos apenas a
esse trabalho negativo, que não traz consigo numa conseqüência benéfica
para aqueles que o executa.
Contudo,
as mudanças no mundo do trabalho acabam revelando que
De
fato, o processo de reestruturação produtiva, que se ancora em novas
formas de regulação do trabalho, baseia-se sobretudo na flexibilização
da produção como ingrediente fundamental para a intensificação do
trabalho, a desregulamentação dos direitos sociais dos trabalhadores, o
enfraquecimento do sindicalismo combativo e a desverticalização da produção
(SILVA, 2001, 82)
Paralelamente
à progressiva dimensão negativa do trabalho, sua dimensão positiva, que
o expressa enquanto atividade intencional e criativa, é proporcionalmente
prejudicada e minimizada, devido às mudanças ocorridas constantemente no
mundo do trabalho.
Podemos
concluir, portanto, que depois desse breve percurso, constatamos que essa
contradição que o trabalho traz historicamente consigo se torna cada vez
mais acentuada, de acordo com os modelos de organização da produção
que vão surgindo no contexto da reestruturação produtiva. Nesse
sentido, a situação aqui analisada expressa que, a contradição dessa
dualidade de dimensões, acaba reforçando a negativa e em detrimento da
positiva. Tudo isso porque o sistema capitalista de produção, tendo em
vista seu próprio benefício, está atento apenas para as questões
objetivas que regem em função de uma lucratividade cada vez maior e as
condições subjetivas são desconsideradas.