À
vontade de conhecer as especificidades e/ou dificuldades e/ou
habilidades que tangem o cotidiano dos portadores de necessidades
especiais e, mais especificamente dos deficientes físicos, surgiu da
proposta de elaboração de um pequeno esboço, sobre a seguinte temática:
questões atuais sobre educação especial.[1]
O objetivo do trabalho era o de contribuir para a desmistificação
(inclusive pessoal!) sobre a “impossibilidade” dos portadores de
necessidades especiais experienciarem determinadas atividades, uma
tentativa de relativizar o imaginário social de menos valia
instalado, que consciente ou inconscientemente difunde e/ou reforça
expectativas como a surpresa, e até mesmo espanto ao encontrar um
cego no cinema, assim como um deficiente físico praticando um
esporte...[2]
É
comum a imposição de padrões posturais e comportamentais, aos
portadores de necessidades especiais, é certo que não só a eles,
afinal, são impostos modelos de sentido, de riqueza, de beleza, de saúde,
etc, a todas as pessoas. Porém, no caso dos deficientes físicos,
restringem-se às experiências de mobilidade e plasticidade. A
visualização da doença antecede a do indivíduo e as seqüelas físicas
e/ou sensoriais acabam por regular as possibilidades de
desenvolvimento da expressividade e da consciência corporal.
“(...)
adultos “conhecedores” das técnicas e das linhas de
desenvolvimento. No seu alto poder, acreditam estar propiciando a
formação desses indivíduos para a autonomia social, mas, muitas
vezes cerceiam a liberdade dos mesmos com tabus e restrições de ações
e comportamentos...” (BUENO
apud CARPES, 2001:25)
Em
contrapartida, é fácil notar, assistindo treinos e jogos, as
faculdades de movimento, espaço e tempo que os atletas apresentam, e
a eficácia dos trabalhos corporal, cognitivo e afetivo desenvolvidos
através da adequação de metodologias de treinamento e ensino para
atender às características de cada um deles, revelando estruturas
que extrapolam suas supostas limitações. O basquete adquire assim,
sentido de desenvolvimento e profilaxia física.
“(...)
se desenvolve o domínio da orientação espacial, do sentido muscular
para a resolução de problemas físicos com economia de esforços e
obtenção de melhores resultados, promove a melhora das funções
circulatória, respiratória, e ainda boa formação corporal, postura
e melhora da qualidade de vida...” (BATISTELLA; KRUG, 2002:94)
Além
dos benefícios citados anteriormente, talvez os reflexos mais
significativos das atividades esportivas na vida dos portadores de
necessidades especiais sejam o fortalecimento da auto-estima, a
auto-afirmação, a participação, a promoção das inter-relações
pessoais e sociais. Isso significa a expansão da cidadania.
“Não
é por decreto que os homens se transformam em cidadãos: é preciso
que tenham interiorizado o valor democrático, que tenham descoberto
seu poder criador, a força instituinte do poder criador coletivo. É
preciso que sejam capazes de considerar como tarefa mais essencial
construir e reconstruir o que deve ser a sociedade, o que deve
significar justiça, igualdade, democracia, cidadania para sua
sociedade”.(VALLE, 2000:30)
Ao
mesmo tempo, isto supõe uma ruptura do conceito estático de homem,
de mundo e de conhecimento. O foco passa a estar na pessoa não na
diferença! A reorganização proposta pela perspectiva de prática do
esporte desconstroi uma série de conceitos e nos faz relembrar a
necessidade de cultivar uma ótica de estranhamento ao que está posto
como natural, é fundamental um contínuo exercício de re-significação
das representações sociais.
O
que diferencia o ser humano das outras formas vivas é justamente, sua
percepção ética, a possibilidade de participação consciente. Que
tipo de geo-sociedade queremos, e que pressupostos orientam as
diretrizes de construção da mesma? Mais do que nunca, emerge uma
questão: se a consubstancialidade das sociedades humanas é a mescla
de elementos heterogêneos, porque a diferença ainda exerce funções
de dissensão e/ou cerceamento de relações?
Talvez
os motivos sejam sociedades preconceituosas, patriarcais, machistas,
patrimoniais, individualistas, consumistas, condescendentes com privilégios
e a corrupção, com as agressões, sejam elas físicas ou morais,
contra os socialmente discriminados, o que causa uma espécie de
letargia que nulifica e/ou anestesia os homens.
A
representatividade do indivíduo se encontra na equação
individual/coletivo, “o todo está incluído na parte, assim como a
parte está no todo, porém, cada parte é dotada de singularidades, e
por isso não representa meros fragmentos do todo” (MORIN,
1999:114), mas a possibilidade de novas e incomensuráveis interconexões.
Por tudo isso, a importância de acolher, agregar e compreender a
alteridade como parte de si mesmo. Mais do que integrar, incluir e
vislumbrar a possibilidade de realizar uma “rede sócio-cósmica de
solidariedade” (BOFF, 2003). E você o que propõe?


[1]
Disciplina obrigatória ministrada no curso de Pedagogia da UERJ.
[2]
Essas questões circunscreveram a opção por uma modalidade
esportiva, o basquete em cadeira de rodas, que no Rio de Janeiro
apresenta um crescente grau de desenvolvimento e organização. Para
maiores informações sobre as regras do jogo, fotos, competições,
entre outras informações que tangem o universo consulte o site www.fbcrerj.org.br.

Referências:
BATISTELLA,
Pedro Antônio; KRUG, Marília de Rosso. Dança e Desenvolvimento
Motor de Portadores de Necessidades Educativas Especiais.
Revista Cadernos de Educação Especial, nº20, p. 89-95, 2002.
BOFF,
Leonardo. Socialismo e Moderna Cosmologia. 2000. Disponível
em: www.leonardoboff.com/artigos.
Acessado em: 23/04/04.
CARPES,
P.S. O perfil motor dos portadores de síndrome de down. Cruz
Alta. Relatório de Pesquisa Universidade de Cruz Alta – UNICRUZ,
Cruz Alta – RS, 2001.
MORIN,
Edgar. O método: o conhecimento do conhecimento. Porto
Alegre: Sulina, 1999.
VALLE,
Lílian do. Cidadania e Escola Pública. In: VALLE, Lílian do, (org.)
O mesmo e o outro da cidadania. Rio de Janeiro:DP e A, 2000,
p.13-32.