Ano I - Nº 01 - Maio de 2001 - Bimensal - Maringá - PR - Brasil - ISSN 1519.6178

 

Participação do Estado na Economia

 

Sergio Ribeiro*

 

Para que um sistema tributário seja considerado ideal e, por inferência, eficiente ele deve seguir algumas prerrogativas que delimitem o seu  campo de ação, dentro da concepção de Estado da classe dominante que, em última análise, acaba por dar direção ao governo. Destarte para que o sistema tributário seja considerado como  tal ele deve conseguir arrecadar as receitas públicas suficientes para manter a estrutura do Estado. De forma que este preste os serviços considerados essenciais à maioria da população.

Todavia delimitar quais funções  são essenciais e, em conseqüência, quais o Estado deve realizar se constitui uma tarefa árdua. Isto porque, sendo diferentes, os indivíduos ocupam lugares díspares no corpo social e, por isto,  acabam por ler de maneira dualista, ou pluralista, a sociedade. Assim devido as diferentes posições na estrutura de classes os indivíduos analisarão de forma, segundo  matizes  ideológicos, diferente quais bens o Estado deve fornecer e de  qual maneira atuar. Sendo assim, se o indivíduo tiver inspiração liberal, o campo de ação do governo será bastante  exíguo. Em contrário senso, se os indivíduos se posicionarem mais à esquerda, ou se tiverem inspiração socialista ou keynesiana, eles acabarão, fatalmente, legando  ao Estado  uma maior gama de atribuições. Dentro deste contexto o sistema tributário é de suma importância, pois são as despesas previstas pelo Governo é que, em última análise,  definem o montante de recursos a ser arrecadado pelo sistema tributário. Logo se a inspiração for a do liberalismo o Estado interferirá o mínimo necessário. Desta forma os gastos do Estado  seriam diminutos não havendo, assim, necessidade de se arrecadar um grande montante de recursos e, por isto, se exigiria pouco do sistema tributário. No entanto se a inspiração for mais a esquerda, socialista ou keynesiana, se exigirá uma maior atuação do sistema tributário, visto que o Estado, nestes casos é mais dispendioso.

Dentro destas perspectivas o Estado é visto sob duas óticas distintas : a dos liberais e dos que pregam a intervenção, de forma acentuada, do Estado na economia. Para os primeiros é o princípio do mercado livre e auto-regulador que dá o norte a seguir. Assim as funções do Estado devem ser tais que não interfiram na livre alocação dos recursos que, sejam eles Capital ou trabalho, na ausência de quaisquer barreiras seriam eficientes. Deste modo o Estado para corresponder ao ideal liberal “...não deve apenas proteger a propriedade privada, mas deve, também, ser constituído de tal forma que o curso suave e pacífico de seu desenvolvimento nunca seja interrompido por guerras civis, revoluções ou insurreições...” ( MISES, 1987, p.40 ).

Pode-se notar que os estado liberal se conforma com a manutenção do status quo, mesmo que tal posicionamento implique em uma condição social precedente, onde pode haver uma desigualdade substancial entre os membros do corpo social. Reduzi-la não seria atribuição do Governo. À esta visão se compatibilizaria um sistema tributário que sofresse forte influência do princípio do benefício, onde existiriam poucos impostos e, em contrapartida, o financiamento dos serviços públicos seria feito por via de taxas, onde quem realmente usasse os serviços os financiariam e não a sociedade como um todo.

Seguindo-se a perspectiva liberal torna-se evidente que o principio da livre atuação das empresas no mercado seria a forma mais racional de se conduzir uma sociedade ao desenvolvimento. Deste modo a atuação do Estado na economia seria subsidiaria à atuação privada dos indivíduos que, na busca por ganhos , lucros e congêneres levaria a sociedade a um devir constante. Entretanto como e ínsito à própria natureza das mudanças sócio-econômicas há avanços e retrocessos. Em contrapartida o Estado deveria  intervir somente para, no dizer liberal, refrear as paixões humanas e, desta maneira, garantir a manutenção da propriedade privada. Isto posto a teoria liberal conduz a um individualismo e a uma luta constante por lucros e, desta forma

 

“... o esforço para melhorar a sua própria condição, quando se permite exercê-la com liberdade e segurança é, a princípio, tão poderoso que ele, sozinho, e sem nenhum auxílio, não somente é capaz de conduzir a sociedade a riqueza e a prosperidade, mas de superar uma centena de obstáculos inoportunos, colocados muito freqüentemente pela loucura das leis humanas para dificultar  as suas ações...” ( SMITH apud CARNOY, 1999, p. 37 ).

 

Assim para SMITH a intervenção humana  através do Estado deveria se periférica em relação à dinâmica social, onde as empresas atuariam livremente no mercado. Isto se deve ao fato de SMITH ver no egoísmo natural  dos indivíduos a mola propulsora da sociedade. Em decorrência disto seria necessário que deixasse o mercado sob a atuação da mão-invisível que, por sua vez, acabaria por alocar de forma satisfatória os fatores de produção, conduzindo a um a maior ganho para um maior número de pessoas.

Seguindo este posicionamento alguns liberais tenderam  a ver as disparidades econômicas entre as nações como sendo decorrentes das características naturais do comportamento dos indivíduos na coletividade. Como o egoísmo mais desejo individual de ganho levariam a uma maior prosperidade para todos, alguns liberais tenderam a propugnar que a pobreza e a riqueza das estavam vinculadas ao caráter  coletivista do país, assim, nas palavras de Smiles, “...o progresso nacional é a soma da diligência e da integridade individual, assim como a decadência nacional é a soma do egoísmo e da imoralidade individual...” ( Smiles apud Bellamy, 1994 ). Tal perspectiva liberal se torna bastante vulnerável, visto que atribuir às diferenças nacionais um determinismo moral é, pelo menos ignorar as condições históricas que determinaram a evolução do capitalismo. Este, por sua vez tende à acumulação de capital por determinados indivíduos em detrimento de outros, o que também ocorre a nível supranacional. Aliás a desigualdade inerente ao capitalismo advém da apropriação da mais valia por parte dos capitalistas tal como consignado por Marx.

Conseqüência de tal teoria seria um Estado barato que deveria se sustentar com uma quantidade mínima de recursos para que não onere de maneira substancial o setor privado. Também decorre daí  que a atuação do Estado como empreendedor se tornaria prejudicial à concorrência sob a égide a da mão invisível de Smith. Destarte um estado para corresponder ao ideal liberal deveria ser barato e deixar que  o mercado livre cuide da distribuição da riqueza.

Apesar das críticas o Estado vem desempenhando um papel cada vez maior na economia, o que, por sua vez faz com que ele exija cada vez mais recursos para sustentar os seus gastos. Entretanto em vários períodos foi o Estado que garantiu, através de seus gastos, o desenvolvimento econômico, e do próprio capitalismo, alocando recursos em atividades que não eram vistas como lucrativas pelo setor privado, mas que eram de suma importância para o desenvolvimento da economia de mercado. Demonstra-se desta maneira que, em determinados períodos, inobstante as críticas liberais, a participação do Estado como agente econômico é essencial.

À visão liberal do Estado mínimo se impõe a perspectiva de um Estado voltado ao bem estar social, ou seja, a um Estado que permita o fornecimento de bens e serviços, mesmo que de forma gratuita. Isto posto todos teriam, em tese, acesso aos bens e serviços públicos considerados essenciais. Seguindo esta orientação foi concebido o Estado-Providência que se difundiu de maneira acentuada no período do pós-guerra. Tal forma de Estado tem como escopo de o bem-estar social e, por isto, busca garantir à classe proletária algumas conquistas sociais. Desta maneira o Estado de bem-estar social “...designa o financiamento público das despesas consagradas ao ensino, aos serviços de saúde, às pensões, às indenizações de desemprego...” (BRUNHOFF, 1991, P.61 ),  em suma a uma ampla proteção social.

Se averigua que o Estado-Providência impõe uma maior intervenção na economia com o intuito de garantir o fornecimento de bens e serviços públicos. Entre estes estão a segurança nacional, a educação, saúde, policiamento, regulação econômica, distribuição da renda, justiça e assistência aos desempregados. Desta maneira as formas de gerir o Governo moldam o Estado. Este sendo de inspiração socialista ou intervencionista preconizará vultosos gastos com o serviço social e com a política econômica.

Já sob o prisma liberal se constituem em funções indispensáveis ao governo  "...as relacionadas com a proteção à vida, à liberdade, à propriedade e à saúde, não se devendo aumentá-las ao ponto de atingirem proporções monstruosas..." ( MISES, 1987, p.117 ). Contudo fica evidente que sob a ótica liberal a proteção social fica relegada a segundo plano, como também a educação e, em alguns casos, a saúde. Seguindo estritamente a lógica liberal tais problemas adicionados ao da distribuição da renda ficariam a cargo do mercado. O que se constitui uma incoerência, visto que a lógica de mercado privilegia o lucro e a acumulação de capital.

A configuração do Estado, sob a égide da doutrina liberal, buscaria uma sistema tributário baseado no princípio do benefício e da neutralidade e, deste modo

"...o velho laissez-faire encontra uma sofisticada justificação moderna. A neutralidade econômica  do Estado, que deve limitar-se a fazer respeitar as regras gerais do jogo garantindo a ordem social e a segurança da propriedade pano de fundo do livre funcionamento dos mercados..." ( BRUNHOFF, 1991, p.40 ).

Assim o Estado só deveria intervir para garantir a liberdade das empresas no mercado e segurança dos agentes econômicos. Em contrário senso tem-se as correntes que pregam um maior intervencionismo estatal e, portanto, buscam conceber o Estado de forma a garantir maiores dispêndios sociais. Para atender a demanda desta forma de Estado o sistema tributário teria como substrato essencial o princípio da capacidade de pagamento, haja vista a sua característica de tornar possível a imposição de um maior ônus tributário às classes mais abastadas. Mas a progressividade decorrente do princípio da capacidade de pagamento tem que se adequar aos demais princípios inerentes a um sistema tributário eficiente sob pena de desvirtuá-lo.



* Acadêmico no Curso de Direito - UEM